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BDI Nº.36 / 1997 - Jurisprudência Voltar

LOTEAMENTO - OBRAS DE INFRA ESTRUTURA - RESPONSABILIDADE DO ADQUIRENTE - CLÁUSULA CONTRATUAL QUE PERMITE O REPASSE DOS CUSTOS INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL - VALIDADE

Recurso Especial nº 43.735 - SP (Registro nº 94.0003332?0) Relator: O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Recorrente: Perrone Empreendimentos Imobiliários S/C Ltda. Recorridos: Cláudio Roberto Medeiros Astolphe e outros Advogados: Drs. Luiz Carlos Bettiol e outros, e Paulo Sérgio de Almeida Ementa Oficial : Direito Civil. Loteamento do solo urbano (Lei 6.766/79). Cláusula contratual que permite o repasse de custos das redes de água e esgoto aos adquirentes dos imóveis. Validade. Inexistência de vedação na lei. Recurso provido. I - A Lei 6.766/79, que trata do parcelamento do solo urbano, não veda o ajuste das partes no tocante à obrigação de custear redes de água e esgoto nos loteamentos, sendo válida, portanto, cláusula contratual que preveja o repasse dos custos de tais obras aos adquirentes dos lotes. II - O que a Lei 6.766/79 contempla, no seu art. 26, são disposições que devem obrigatoriamente estar contidas nos compromissos de compra e venda de lotes, requisitos mínimos para a validade desses contratos, o que não significa que outras cláusulas não possam ser pactuadas. Em outras palavras, além das indicações que a lei prescreve como referências obrigatórias nos contratos, podem as partes, dentro das possibilidades outorgadas pela lei de pactuar o lícito, razoável e possível, convencionar outras regras que as obriguem. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, prosseguindo no julgamento, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e dar?lhe provimento, vencido o Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Fontes de Alencar. Brasília, 12 de novembro de 1996. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Aforaram os recorridos, adquirentes de imóveis em um loteamento implantado pela recorrente, ação declaratória de inexigibilidade de obrigação. Relataram que foram notificados para o pagamento das despesas de implantação dos serviços de infra?estrutura, pertinentes às redes de água e esgoto dos referidos lotes e sustentaram que tais obras, sendo básicas, incumbiriam ao loteador, consoante legislação municipal editada na conformidade da Lei 6.766/79. A sentença julgou procedente o pedido, entendendo que, embora a Lei 6.766/79 não encerre previsão normativa, possibilita a edição de normas municipais disciplinadoras da urbanização. Daí a validade da legislação de Bebedouro?SP, que prescreve como ônus do loteador a construção de redes de água e esgoto. E concluiu também por desconsiderar a cláusula contratual que previa o repasse dos custos aos adquirentes dos lotes em razão da força cogente da norma de ordem pública relacionada com a urbanização das cidades. À apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento. Manifestados declaratórios, restaram rejeitados. Inconformada, interpôs a ré recurso especial alegando violação: a) - do art. 1º , parágrafo único, da Lei 6.766/79, uma vez que o Município, não obstante possa estabelecer normas complementares relativas ao parcelamento do solo, não pode, contudo, em matéria de competência exclusiva da lei federal, criar direitos ou impor obrigações por ela não previstos; b) - dos arts. 18?V e 26, do mesmo diploma legal, porque em ambos não existe a proibição do loteador ratear o custo das obras de infra?estrutura entre os adquirentes; c) - do art. 17, CPC, tendo em vista que os autores alteraram a verdade dos fatos ao afirmar que não estavam sendo feitas obras de infra?estrutura no loteamento, requerendo a condenação destes nas penas de litigante de má?fé. Sustenta ainda que se operou infringência aos princípios da boa?fé, da autonomia da vontade e da obrigatoriedade da convenção, por ter sido desconsiderada a cláusula contratual que previa a assunção pelos adquirentes das despesas com a implantação das redes de água e esgoto, e do enriquecimento ilícito, uma vez presente locupletamento por parte dos autores dos custos dos equipamentos urbanos. Contra arrazoado, foi o recurso admitido na origem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): Enfatizou o acórdão recorrido, citando o art. 26 da Lei 6.766/79, que existe vedação de repasse, aos adquirentes dos imóveis, pelo loteador, das despesas tidas como obras elementares do loteamento, haja vista que a citada Lei não os incluiu como integrante do preço a ser pago para cada lote. Premissa errada, contudo. O que a lei prevê, no art. 26, são disposições que devem obrigatoriamente estar contidas nos compromissos de compra?e?venda de lotes, requisitos mínimos para a validade dos referidos contratos, não significando que outras cláusulas não possam estar presentes no ajuste. Em suma, afora as indicações que a lei prescreve como referências compulsórias nos contratos, as partes, dentro das possibilidades outorgadas pela lei de pactuar o lícito e possível, podem convencionar outras regras que as obriguem. E nesse sentido, merece prestígio a cláusula contratual que permite a cobrança aos adquirentes, pela loteadora, das obras realizadas no loteamento, via ressarcimento, sob pena de violação do princípio pacta sunt servanda. Muito embora não seja absoluto o princípio da autonomia da vontade, haja vista a constante intervenção do Estado no domínio privado para garantir a ordem pública e a supremacia do bem coletivo em detrimento do individual, incomuns são as oportunidades em que ele é desprezado. No caso dos autos, descabe restringir o contratado. Inexiste motivo de ordem pública a prevalecer e o ajustado - repasse das verbas aos adquirentes dos lotes - está dentro dos limites do lícito e do razoável. Válida, portanto, a cláusula constante do contrato que permite a cobrança dos serviços de rede de água e esgoto dos recorridos. Neste sentido, a lição de Villaça Azevedo, verbis: "Pelo já exposto, não seria crível que a Lei, ao atribuir ao loteador a obrigação de realizar os custos do loteamento, o obrigasse, também, a arcar com numerário próprio e sem qualquer remuneração por seus serviços. A assim ser, estariam os adquirentes de lotes locupletando?se, de modo indevido. Lembremo?nos das sábias palavras de Waldemar Ferreira (O loteamento de terrenos urbanos de propriedade particular e o domínio público dos espaços livres, in Revista dos Tribunais, São Paulo, vol. 215, pág. 5), ainda sob a égide da legislação antiga: ´Não se deve perder de conta, para que bem se aprecie o problema do loteamento de terrenos particulares para o efeito de sua venda para construções urbanas, que o proprietário, que toma tal iniciativa e a leva a cabo, se propõe transmudar o objeto de seu direito de propriedade, aproveitando?se desta para a realização de lucro de seu inteiro proveito, mas realizando, inequivocamente, obra ou serviço público´. É preciso que se entenda o loteador como um empresário, que implanta um loteamento também para ter lucros. Assim, além da remuneração por seus serviços, há que ser reembolsado, com a devida correção monetária, e juros, do que despendeu na realização das obras de infra?estrutura do loteamento" (Direito Privado 3: Casos e Pareceres. Cejup, 1989, pág. 45). Toshio Mukai, em parecer juntado aos autos, referindo?se a artigo seu denominado Infra?Estrutura e o Repasse dos seus Custos nos Loteamentos, publicado no BDI?Boletim de Direito Imobiliário - 1º decêndio - junho de 1984, doutrina: "Inexiste na Lei federal nº 6.766, de 1979, qualquer preceito, de ordem pública ou não, proibindo o loteador de efetuar o repasse dos custos das obras de infra?estrutura aos adquirentes dos lotes. Contudo, trata?se de uma obrigação de direito público imposta ao loteador, que diz respeito apenas ao dever de executar as obras, que o loteador tem perante a Prefeitura. A outra obrigação entre •••

(STJ, RSTJ nº 95, Jul/97, p. 286)