Juridicidade da contratação de seguro prestamista nos contratos de construção de edificação em condomínio sob o regime de administração¹
Desde a década passada, verifica-se um crescimento progressivo dos empreendimentos imobiliários voltados para a construção de condomínios em edificações, empregando-se, entre outros, os chamados contratos de construção de edificação em condomínio, sob o regime de administração (preço de custo). A rigor, os contratos para construção de condomínios em edificações são regulados, prima facie, pela Lei n. 4.591, de 16 de dezembro de 1964², submetendo-se, outrossim, à disciplina da legislação complementar aplicável (v.g. Lei n. 9.514/97, Lei n. 10.931/2004 etc.). Para os contratos de promessa de venda e compra de futura unidade autônoma em condomínio edilício em construção, por meio de incorporação, o Superior Tribunal de Justiça, prestigiando a técnica “diálogo das fontes”, permite a aplicação coordenada do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90) em conjunto com a Lei n. 4.591/64: “INCORPORAÇÃO. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. RESTITUIÇÃO. LEI 4.591/64. CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. O CONTRATO DE INCORPORAÇÃO, NO QUE TEM DE ESPECIFICO, E REGIDO PELA LEI QUE LHE E PROPRIA (LEI 4.591/64), MAS SOBRE ELE TAMBEM INCIDE O CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, QUE INTRODUZIU NO SISTEMA CIVIL PRINCIPIOS GERAIS QUE REALÇAM A JUSTIÇA CONTRATUAL, A EQUIVALENCIA DAS PRESTAÇÕES E O PRINCIPIO DA BOA-FE OBJETIVA. 2. A ABUSIVIDADE DA CLAUSULA DE DECAIMENTO, COM PREVISÃO DE PERDA DAS PARCELAS PAGAS EM FAVOR DO VENDEDOR, PODE SER RECONHECIDA TANTO NA AÇÃO PROPOSTA PELO VENDEDOR (ART. 53 DO CODECON) COMO NA DE INICIATIVA DO COMPRADOR, PORQUE A RESTITUIÇÃO E INERENTE A RESOLUÇÃO DO CONTRATO E MEIO DE EVITAR O ENRIQUECIMENTO INJUSTIFICADO. 3. POREM, NÃO VIOLA A LEI O ACORDÃO QUE EXAMINA FATOS E CONTRATOS A LUZ DO CODECON E NEGA A EXTINÇÃO DO CONTRATO DE INCORPORAÇÃO, AFASTANDO A APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO E A ALEGAÇÃO DE CULPA DA EMPRESA VENDEDORA. MANTIDO O CONTRATO, NÃO HA CUIDAR DA DEVOLUÇÃO DAS PRESTAÇÕES PAGAS. RECURSO NÃO CONHECIDO (SUMULAS 5 E 7). (REsp 80.036/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 12/02/1996, DJ 25/03/1996, p. 8586); AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO INCAPAZ DE ALTERAR O JULGADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. (...) 2. Em que pese o contrato de incorporação ser regido pela Lei nº 4.591/64, admite-se a incidência do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser observados os princípios gerais do direito que buscam a justiça contratual, a equivalência das prestações e a boa-fé objetiva, vedando-se o locupletamento ilícito. 3. O incorporador, como impulsionador do empreendimento imobiliário em condomínio, atrai para si a responsabilidade pelos danos que possam resultar da inexecução ou da má execução do contrato de incorporação, incluindo-se aí os danos advindos de construção defeituosa. (...) (AgRg no REsp 1006765/ES, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 12/05/2014) Todavia, tratando-se de relação contratual de construção sob o regime de administração (preço de custo), o Superior Tribunal de Justiça afastou a incidência da legislação especial do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aplicando, assim, a Lei n. 4.591/64, verbis: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. CONSTRUÇÃO A PREÇO DE CUSTO. CONDÔMINOS INADIMPLENTES. LEILÃO DAS FRAÇÕES IDEAIS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. Tratando-se de construção sob o regime de administração ou preço de custo, o construtor não pode ser considerado parte legítima para figurar no polo passivo de ação cujo escopo seja a restituição de parcelas pagas diretamente ao condomínio e por ele administradas para investimento na construção. 2. No caso em exame, os proprietários do terreno e os adquirentes das frações ideais formaram condomínio, ajustando a construção de edifício, sob o regime de preço de custo. Destarte, a relação jurídica estabeleceu-se entre os condôminos e o condomínio. Os primeiros ficavam responsáveis pelos custos da obra e o segundo por sua administração, fiscalização e pelos investimentos dos valores percebidos no empreendimento imobiliário. 3. Não há relação de consumo a ser tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor. Na realidade, a relação jurídica, na espécie, é regida pela Lei de Condomínio e Incorporações Imobiliárias (Lei 4.591/64). 4. O art. 63 dessa lei prevê a possibilidade de o condomínio alienar em leilão a unidade do adquirente em atraso, visando à recomposição de seu caixa e permitindo que a obra não sofra solução de continuidade. Todavia, a autorização de alienação do imóvel não pode ensejar o enriquecimento sem causa do condomínio, de maneira que o § 4º estabelece que do valor arrematado deverão ser deduzidos: (I) o valor do débito; (II) as eventuais despesas; (III) 5% a título de comissão; e (IV) 10% de multa compensatória. E, havendo quantia remanescente, deverá ser devolvida ao condômino inadimplente. 5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 860.064/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe 02/08/2012; grifou-se). Pois bem. O legislador também estabeleceu cláusulas essenciais específicas para os contratos de construção sob o regime de administração, nos arts. 58, 59, 60 e 62 da Lei n. 4.591/64, verbis: “Art. 58. Nas incorporações em que a construção for contratada pelo regime de administração, também chamado "a preço de custo", será de responsabilidade dos proprietários ou adquirentes o pagamento do custo integral de obra, observadas as seguintes disposições: I - todas as faturas, duplicatas, recibos e quaisquer documentos referentes às transações ou aquisições para construção, serão emitidos em nome do condomínio dos contratantes da construção; II - todas as contribuições dos condôminos para qualquer fim relacionado com a construção serão depositadas em contas abertas em nome do condomínio dos contratantes em estabelecimentos bancários, as quais, serão movimentadas pela forma que for fixada no contrato. Art. 59. No regime de construção por administração, será obrigatório constar do respectivo contrato o montante do orçamento do custo da obra, elaborado com estrita observância dos critérios e normas referidos no inciso II, do art. 53 e a data em que se iniciará efetivamente a obra. § 1º Nos contratos lavrados até o término das fundações, este montante não poderá ser inferior ao da estimativa atualizada, a que se refere o § 3º, do art. 54. § 2º Nos contratos celebrados após o término das fundações, este montante não poderá ser inferior à última revisão efetivada na forma do artigo seguinte. § 3º As transferências e sub-rogações do contrato, em qualquer fase da obra, aplicar-se-á o disposto neste artigo. Art. 60. As revisões da estimativa de custo da obra serão efetuadas, pelo menos semestralmente, em comum entre a Comissão de Representantes e o construtor. O contrato poderá estipular que, em função das necessidades da obra sejam alteráveis os esquemas de contribuições quanto ao total, ao número, ao valor e à distribuição no tempo das prestações. Parágrafo único. Em caso de majoração de prestações, o novo esquema deverá ser comunicado aos contratantes, com antecedência mínima de 45 dias da data em que deverão ser efetuados os depósitos das primeiras prestações alteradas. Art. 62. Em toda publicidade ou propaganda escrita destinada a promover a venda de incorporação com construção pelo regime de administração em que conste preço, serão discriminados explicitamente o preço da fração ideal de terreno e o montante do orçamento atualizado do custo da construção, na forma dos artigos 59 e 60, com a indicação do mês a que se refere o dito orçamento e do tipo padronizado a que se vincule o mesmo. § 1º As mesmas indicações deverão constar em todos os papéis utilizados para a realização da incorporação, tais como cartas, propostas, escrituras, contratos e documentos semelhantes: § 2º Esta exigência será dispensada nos anúncios "classificados" dos jornais”. A propósito da estimativa prévia do custo no contrato de construção à preço de custo, conclui Arnaldo Rizzardo “que o regime de administração não importa em imprevisão de valores. Aliás, em todos os setores exige-se uma estimativa prévia do custo, até para aferir a viabilidade econômica da obra, e sua compatibilidade com o poder financeiro dos •••
Frederico Price Grechi*