ATA NOTARIAL – FINAL
4. AUXÍLIO DO DIREITO LEGISLADO E DA DOUTRINA ESTRANGEIRA QUANTO AO ALCANCE DA ATA NOTARIAL NO BRASIL Recorre-se à vasta doutrina do Direito Notarial espanhol, argentino e uruguaio, para captar a finalidade da ata notarial, já delineada – ainda que fragmentariamente – em tópicos antecedentes, e para nortear sua inserção na prática notarial brasileira. Percebe-se, nas pesquisas, enorme diversidade de classificações, um tanto ou quanto fluidas e arbitrárias, com designações às vezes incoerentes ou ambíguas, dadas as aproximações, as variantes, as interpenetrações e o hibridismo das diversas modalidades de ata notarial. Por isso, afigura-se de prudente alvitre fazer duas distinções apenas, necessárias para orientar o raciocínio ora desenvolvido. A primeira, de amplo espectro, é entre atas a requerimento de pessoa interessada, que é a regra, decorrente do princípio da rogação, ou princípio da instância, norteador da atividade notarial, e, excepcionalmente, atas de ofício, ou seja, as que, por desbordo da regra geral, o notário espanhol e o hispano-americano lavram para fazer constar a ocorrência de um fato concreto que esteja impedindo ou dificultando o exercício de suas funções e ainda as que lavram, com a designação de atas de subsanación (art. 153 do Regulamento Notarial Espanhol) para suprir omissões ou corrigir defeitos de forma ocorridos em escritura pública, aos quais possam eles mesmos ter dado causa, desde que não sejam afetadas as declarações de vontade das partes nem haja risco de prejuízo a terceiros, segundo o prudente arbítrio do notário e com a devida cautela, a exemplo do que, no Brasil, permite a regra constante do art. 213 da Lei dos Registros Públicos, no concernente ao serviço imobiliário, o qual preceito, por analogia, pode e deve ser aplicado à modalidade excepcional de ata em questão, como eficaz e prático meio, desde que não haja abuso, nas escrituras públicas de efeitos inter vivos, de sanar simples descuidos imputáveis às partes ou ao tabelião de notas e até mesmo erros oriundos de defeitos em documentação habilitante para escritura pública, só posteriormente a ela verificados. As atas que se lavram para suprimento de omissões ou correção de defeitos de forma em escritura pública podem também resultar da rogação de pessoa interessada. A outra distinção é entre atas em livro de notas e atas avulsas, aquelas constituindo a regra e estas, as exceções, a exemplo do auto de aprovação de testamento cerrado. Na prática notarial espanhola, onde, mais que livro de notas, adota-se o protocolo notarial, a distinção é entre atas protocolizadas (atas em sentido estrito) e atas não protocolizadas (atas em sentido amplo), que abrangem também as autenticações de documentos avulsos (estas não como praticadas indiscriminada e descuida-dosamente no Brasil). Já na Argentina, ao que se depreende da lição de ARGENTINO I. NERI, a ata normalmente é reduzida a escrito fora das notas, arquivando-se cópia, mas, quando, por razões especiais, a documentação do fato jurídico é feita no protocolo notarial, aí consta sob a designação de escritura pública, ao fundamento de que o protocolo abriga exclusivamente escritura. E aqui no Brasil, o Rio Grande do Sul parece seguir orientação influenciada pelo vizinho país (diferente da recomendada nestes apontamentos e que é também a de ANTÔNIO ALBERGARIA PEREIRA, ou seja, lavratura em livro de notas), uma vez que, segundo o estudioso notário SÉRGIO AFONSO MANICA, de Porto Alegre, em texto publicado no Boletim Cartorário nº 18 (BDI – BOLETIM DO DIREITO IMOBILIÁRIO, 3º decêndio junho/1998, págs. 27-31), lá a ata é lavrada em instrumento avulso e fica registrado em livro o seu teor, a exemplo do que faz, de longa data, o tabelião brasileiro de protesto de títulos. 5. UTILIDADE DA ATA NOTARIAL NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO COMO MEIO DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA Em primeva conceituação do instrumento público notarial, ele era caracterizado como meio de prova pré-constituída, o que é um dos aspectos importantes de sua natureza, mas a relevância por ele adquirida o sobreleva à finalidade meramente probatória, que pressupõe litígio potencial a dar-lhe ou a lhe negar respaldo. Ora, o instrumento público notarial existe e é eficaz por si mesmo, faz realizar o direito na normalidade da vida social e, acima de tudo, a sua qualificação e a sua respeitabilidade, pela certeza e segurança a ele inerentes, são fatores de prevenção de litígio. Então, mais que meio de prova pré-constituída, o instrumento público notarial vale pelo que é, desde o momento em que se concretiza, e já nasce com o destino de harmonizar as pessoas em suas relações jurídicas no meio social. Não se pode negar, todavia, que a ata notarial, por sua natureza, como espécie do gênero instrumento público, se reveste de especial importância para obter-se uma produção antecipada de prova •••
João Teodoro da Silva (*)