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BDI Nº.10 / 1993 - Assuntos Cartorários Voltar

RECONHECIMENTO DE FIRMA DE PESSOA CEGA

1. O fato ocorreu em um Cartório de Notas em Brasília. Um cego pretendeu abrir um cartão de sua firma para tê-la reconhecida, pelo notário, num contrato por ele firmado. 2. O notário não autorizou a confecção do cartão de autógrafos por entender que o cego, tendo sua capacidade limitada em face dos artigos 142, 1.637 e 1.650 do Código Civil, não poderia obrigar-se por instrumento particular, pelo que inócua seria a abertura de sua ficha de firma. 3. A pessoa interessada, cega, pediu que o notário, por escrito, fundamentasse as razões de sua recusa. Estava ele - o notário - disposto a dar por escrito o seu entendimento quando resolveu nos consultar por telefone, sobre a improcedência ou procedência do seu comportamento funcional. 4. Não tivemos dúvida em afirmar, de pronto, que seu proceder estava incorreto, notadamente quanto a recusa em abrir a ficha de firma do interessado cego. 5. A grande virtude dos estudiosos e inteligentes é sua capacidade de raciocínio. O nosso consulente é dotado de comprovada capacidade profissional. Notário estudioso e cauteloso, logo deu conta da falha do seu entendimento e alterou-o, providenciando a abertura da ficha de firma, solicitada pelo interessado cego. 6. Depois nos escreveu: “Dr. Albergaria. Eu estava convicto da precisão jurídica a que me levou a lógica do meu raciocínio. No dia em que lhe telefonei para agradecer o artigo sobre Distribuição de Escrituras no Distrito Federal, comentei sobre o assunto mais para ouvir um “muito bem” do que um “você está errado”. Surpreso, fui mais fundo ao estudo para ver se entendia o seu ponto de vista. Em resumo, a trilha do novo raciocínio que formou meu convencimento foi esta. O que não é defeso em lei presume-se permitido. A lei que restringe direito não pode ir além do que especifica. Sua interpretação deve ser estrita. Os cegos, por não estarem entre os incapazes no Código Civil, são pessoas capazes. O mesmo Código excepciona, em seus artigos 142, 1.637 e 1.650, os atos que os cegos não podem praticar. Os atos que não se enquadram naqueles artigos, permitem-se. E mais, entre a restrição e a liberdade deve-se interpretar a favor desta, quando não a impede o Direito”. Aí está a veracidade de nossa afirmativa. O nosso consulente, além de estudioso, é inteligente. E conclui ele sua carta. “Dr. Albergaria. Vivendo e aprendendo, comparando os dois pontos-de-vista, hoje, vejo primeiro, o da minha recusa, própria de um leguleio. O senhor estava com a razão: eu estava errado. Agradeço-lhe a participação valiosa e oportuna, e apesar de considerá-lo “suspeito” para defender a capacidade plena •••

Antonio Albergaria Pereira