Desconhecimento de ações contra os vendedores não exime o comprador/terceiro de boa-fé do cumprimento da obrigação de pagar a dívida
Comentário: O terceiro adquirente que tenha conhecimento sobre o litígio que envolve o bem e seus antigos vendedores assume o risco de ser executado. Assumindo este risco o comprador atuará em nome próprio na defesa de interesses alheios, razão pela qual sofrerá os efeitos da sentença, conforme previsto no §3º do art. 42 do CPC. Todavia, para o terceiro de boa-fé, no caso, o comprador, o simples fato de alegar o desconhecimento de eventuais ações movidas em desfavor do vendedor do imóvel, não afasta a possibilidade dos efeitos da sentença recair sobre ele. A documentação exigida pela lei, que deverá ser apresentada no cartório de notas para a lavratura da escritura, consiste numa prova da boa-fé do comprador. Mesmo tendo sido adotadas medidas cautelares, nada impede que recaia sobre o imóvel alguma obrigação. Assim, competirá ao comprador/terceiro de boa-fé comprovar suas alegações de que agiu com o devido cuidado e a parte contrária, no caso, o exequente, ilidir a alegação de boa-fé para demonstrar o conluio e invalidar a transação ou reaver o bem. Recurso em Mandado de Segurança nº 27.358 - RJ (2008⁄0159701-3) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: Antônio Martins de Freitas Júnior Recorrido: União Interes.: Ottoni Faria de Oliveira e Cônjuge EMENTA Processo Civil. Alienação de bem imóvel litigioso. Terceiro adquirente. Extensão dos efeitos da sentença. Limites. 1. A regra do art. 42, § 3º, do CPC, que estende ao terceiro adquirente os efeitos da coisa julgada, somente deve ser mitigada quando for evidenciado que a conduta daquele tendeu à efetiva apuração da eventual litigiosidade da coisa adquirida. Há uma presunção relativa de ciência do terceiro adquirente acerca da litispendência, cumprindo a ele demonstrar que adotou todos os cuidados que dele se esperavam para a concretização do negócio, notadamente a verificação de que, sobre a coisa, não pendiam ônus judiciais ou extrajudiciais capazes de invalidar a alienação. 2. Na alienação de imóveis litigiosos, ainda que não haja averbação dessa circunstância na matrícula, subsiste a presunção relativa de ciência do terceiro adquirente acerca da litispendência, pois é impossível ignorar a publicidade do processo, gerada pelo seu registro e pela distribuição da petição inicial, nos termos dos arts. 251 e 263 do CPC. Diante dessa publicidade, o adquirente de qualquer imóvel deve acautelar-se, obtendo certidões dos cartórios distribuidores judiciais que lhe permitam verificar a existência de processos envolvendo o comprador, dos quais possam decorrer ônus (ainda que potenciais) sobre o imóvel negociado. 3. Cabe ao adquirente provar que desconhece a existência de ação envolvendo o imóvel, não apenas porque o art. 1.º, da Lei n.º 7.433⁄85, exige a apresentação das certidões dos feitos ajuizados em nome do vendedor para lavratura da escritura pública de alienação, mas, sobretudo, porque só se pode considerar, objetivamente, de boa-fé o comprador que toma mínimas cautelas para a segurança jurídica da sua aquisição. 4. Recurso ordinário em mandado de segurança a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso em mandado de segurança, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Vasco Della Giustina votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). Christian Barbalho do Nascimento, pela parte Recorrente: Antônio Martins de Freitas Júnior. Brasília (DF), 05 de outubro de 2010(Data do Julgamento) Ministra Nancy Andrighi, Relatora RELATÓRIO A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relator): Cuida-se de recurso ordinário em mandado de segurança interposto por Antônio Martins de Freitas Júnior, com fundamento no art. 105, II, “b”, da CF, contra acórdão proferido pelo TRF da 2ª Região. Ação: de anulação de leilão e arrematação, ajuizada por Ottoni Faria de Oliveira e Neuza Larieu de Oliveira (“AUTORES”) em desfavor de Morada S.A. – Crédito Imobiliário, atual denominação social de Banco Morada S.A. (“MORADA”) e Caixa Econômica Federal (“CEF”) (fls. 23⁄26). Sentença: julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar a nulidade do leilão extrajudicial do apartamento nº 910 do prédio localizado na Av. Professor Fausto Moreira, 406 (fls. 32⁄39). Cumprimento da sentença: negado provimento às apelações interpostas por MORADA e CEF (fls. 40⁄49) e tendo havido recurso especial apenas por parte da instituição financeira, ainda assim somente para discutir sua legitimidade para figurar no polo passivo da ação, os AUTORES deram início ao cumprimento da sentença. Decisão interlocutória: o Juiz determinou a reintegração dos AUTORES na posse do mencionado imóvel (fl. 140), bem como o cancelamento de todo e qualquer registro de transferência de domínio do bem (fl. 142). Mandado de segurança: impetrado pelo recorrente, sob a alegação de que adquiriu o imóvel há mais de 10 anos, por meio de promessa de compra e venda celebrada com MORADA, bem como que nunca foi parte, nem sequer teve notícia da existência da ação anulatória (fls. 02⁄11). Acórdão: o TRF da 2ª Região denegou a segurança, nos termos do acórdão (fls. 508⁄518) assim ementado: PROCESSUAL CIVIL – CIVIL – SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO – FINANCIAMENTO DE COMPRA DE BEM IMÓVEL – CONTRATO DE MÚTUO DE DINHEIRO – GARANTIA REAL HIPOTECÁRIA – PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL – DECRETO-LEI N.º 70⁄66 – ANULAÇÃO – REINTEGRAÇÃO NA POSSE DIRETA – CANCELAMENTO DE REGISTROS DE AQUISIÇÃO REALIZADOS EM CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS – EXECUÇÃO – IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA POR TERCEIRO – ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – COMPRA INTER VIVOS DA COISA LITIGIOSA – SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – ABERTURA DOS LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA MATERIAL – VÍCIOS DA POSSE DIRETA – DENEGAÇÃO DO WRIT. I – Como o Impetrante, apresentando-se como Terceiro, impugna atos processuais dos quais decorreram a reintegração de determinado casal na posse direta sobre o bem imóvel em foco e o cancelamento de quaisquer registros de aquisição do mesmo realizados em Cartório do Registro de Imóveis, a impetração do presente mandado de segurança, quanto a esse aspecto, vai ao encontro do entendimento consagrado através do Enunciado n.º 202 da Súmula do STJ. II – Não tendo o Impetrante sido parte do processo anterior, não obstante, ele é atingido indiretamente pela eficácia do decisum, em razão de se apresentar como terceiro juridicamente interessado; e, mais do que isso, ele é atingido pela imutabilidade do mesmo, estando abrangido pelos limites subjetivos da coisa julgada material, em razão de assumir, já no curso do processo supra referido e na respectiva fase cognitiva, a posição jurídica de Substituído Processual (que é Parte em sentido material), conforme o art. 42, § 3.º, do CPC⁄1973; e, nesse passo, em razão de apresentar, após a aquisição inter vivos e a título singular a coisa em foco já litigiosa por meio de compra, conforme os arts. 42, caput, c⁄c 219, caput, interesse jurídico igual ao de uma das Partes do processo. III – Mesmo que assim não fosse, o Impetrante não se apresenta como terceiro de boa-fé, eis que conhecia inequivocamente a existência do processo anterior e provavelmente a anulação de procedimento de execução extrajudicial na forma do Decreto-lei n.º 70⁄1966, fundada em garantia real hipotecária de contrato de mútuo de dinheiro celebrado entre a CEF – Caixa Econômica Federal e o casal, a qual atingira negativamente a arrematação do mesmo por determinado Banco e, por conseguinte, a própria posse por este ulteriormente transmitida a ele. IV – Assim, é possível a reintegração do casal na posse direta sobre o bem imóvel em foco e •••
(STJ)