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BDI Nº.17 / 2011 - Jurisprudência Voltar

É cabível ação de reintegração de posse fundada exclusivamente no “constituto possessório” – Adquirente que não ocupa o imóvel imediatamente

Recurso Especial nº 1.158.992 - MG (2009/0186292-3) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: Adriana de Freitas Pacheco Recorrido: Anísio Tréssia Filho Direito civil. Posse. Aquisição. Constituto possessório. Manejo de ações possessórias. Possibilidade. 1. O recurso especial não pode ser conhecido na hipótese em que a parte indica de maneira errônea o dispositivo supostamente violado. Inteligência da Súmula 284/STF. 2. Não é de se exigir do Tribunal que conheça de fato superveniente ao julgamento do recurso de apelação, ainda que anterior ao julgamento dos respectivos embargos de declaração. Ao julgar a causa, o Tribunal a analisa consoante os fatos ocorridos até o julgamento; os embargos de declaração se prestam apenas ao esclarecimento das questões julgadas, do modo como se manifestavam à época. 3. Eventual sentença que poderia influir no julgamento da causa, proferida em outro processo, não deve ser levada em consideração se posteriormente reformada pelo Tribunal. 4. A regra do art. 129 do CPC destina-se a coibir a utilização do processo para fim ilícito, por ambas as partes, autor e réu. Na hipótese em que uma das partes alegadamente se vale do processo para pleitear direito inexistente, a norma não é aplicável. 5. Na posse, o elemento corpus não demanda, para sua caracterização, a apreensão física do bem. Esse elemento, em vez disso, consubstancia ‘o poder físico da pessoa sobre a coisa, fato exterior em oposição ao fato interior’ (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil). Consoante a doutrina de Ihering, a posse caracteriza-se pela visibilidade do domínio e é possível que ela tenha, historicamente, se iniciado pela ideia de poder de fato sobre a coisa, mas a evolução demonstrou que ela pode se caracterizar sem o exercício de tal poder de maneira direta. 6. O adquirente de imóvel que não o ocupa por um mês após a lavratura da escritura, com cláusula de transmissão expressa da posse, considera-se, ainda assim, possuidor, porquanto o imóvel encontra-se em situação compatível com sua destinação econômica. É natural que o novo proprietário tenha tempo para decidir a destinação que dará ao imóvel, seja reformando-o, seja planejando sua mudança. 7. Se na escritura pública inseriu-se cláusula estabelecendo constituto possessório, é possível ao adquirente manejar ações possessórias para defesa de seu direito. 8. Recurso especial conhecido e improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Vasco Della Giustina votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 07 de abril de 2011(Data do Julgamento) Ministra Nancy Andrighi, Relatora RELATÓRIO A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por ADRIANA DE FREITAS PACHECO objetivando impugnar acórdão exarado pelo TJ⁄MG no julgamento de recurso de apelação. Ação: de reintegração na posse ajuizada por ANÍSIO TRÉSSIA FILHO em face da recorrente. O autor alega que adquiriu imóvel localizado na Av. Nicomedes Alves dos Santos, nº 490, em Uberlândia, MG, vendido pela ré por intermédio de seu procurador, JORGE EDUARDO DA CUNHA ABRÃO, por escritura de 27 de março de 2002. Segundo alega, a posse do imóvel, que se encontrava desocupado, foi transferida no ato da escritura, mas em 6 de maio de 2002 a vendedora, desrespeitando os termos do contrato, reocupou o bem, contratando faxineiras para limpá-lo e trocando as respectivas chaves de modo a impedir que o comprador nele ingressasse. A ré respondeu a ação afirmando: (i) carência de ação possessória, porquanto o autor jamais tomara posse do imóvel controvertido; (ii) conexão entre este processo e a ação anulatória de escritura proposta perante a 10ª Vara Cível de Uberlândia, processo nº 70202014080-3; (iii) improcedência do pedido, já que a ré comunicara a seu antigo procurador, JORGE EDUARDO DA CUNHA ABRÃO, que não pretendia vender o bem, cujo preço sequer recebeu; entre outras alegações. Sentença: julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que, não obstante a transferência da propriedade, o autor nunca teria exercido a posse do imóvel, sendo o constituto possessório insuficiente para essa fim. A sentença foi impugnada mediante recurso de apelação. Acórdão: deu provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa: POSSESSÓRIA - REINTEGRAÇÃO DE POSSE - ART. 927 DO CPC - ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA - CLÁUSULA \'CONSTITUTI\' - TRANSFERÊNCIA VÁLIDA DA POSSE - ESBULHO CARACTERIZADO - PERDAS E DANOS - DEFERIMENTO. 1. Incumbe ao autor da ação de reintegração de posse provar a sua posse anterior, o esbulho praticado pelo réu, a data do esbulho e a perda da posse (art. 927 do CPC). 2 - A aquisição da posse se dá também pela cláusula \'constituti\' inserida em escritura pública de compra e venda de imóvel, o que autoriza o manejo dos interditos possessórios pelo adquirente, mesmo que nunca tenha exercido atos de posse direta sobre o bem. 3 - É cabível a ação possessória de reintegração fundada exclusivamente no constituto possessório, conforme cláusula constante de regular escritura pública de compra e venda. 4 - Hipótese dos autos que a escritura pública de compra e venda em que fora baseada a ação possessória prevê a cláusula referente ao constituto possessório. 5 - Demonstrado o esbulho, deverá o esbulhador indenizar o possuidor por perdas e danos, a ser apurada em liquidação de sentença. Embargos de declaração: interpostos por duas vezes, em ambas rejeitados. Recurso especial: foi interposto com fundamento na alínea \'a\' do permissivo constitucional. Alega violação do art. 535, II, do CPC, por negativa na prestação jurisdicional; 183 e 282, III, do CPC, porquanto o autor teria promovido uma modificação indevida na causa de pedir da ação após contestado o pedido; 462 do CPC, porque o TJ⁄MG não teria levado em consideração fatos supervenientes relevantes ao decidir; 129 do CPC, já que este processo estaria sendo usado para dar validade a uma venda simulada; 485 e 494 do CC⁄16, pois a posse do imóvel controvertido jamais teria sido transmitida ao recorrido, o que tornaria impossível o acolhimento da ação possessória. Medida cautelar: ajuizada com o objetivo de atribuir efeito suspensivo ao recurso especial, com liminar deferida. É o relatório. VOTO A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relator): Cinge-se a lide a estabelecer a possibilidade de propositura de reintegração de posse por adquirente de imóvel em face de antigo proprietário, na hipótese em que o comprador tomou posse do bem mediante constituto possessório e há, concomitantemente à ação possessória, uma ação de anulação da escritura. Também se discutem temas processuais, que serão abordados ao longo deste voto. I - Negativa de prestação jurisdicional. Violação do art. 535 do CPC. Os embargos de declaração constituem instrumento processual de emprego excepcional, visando ao aprimoramento dos julgados que encerrem obscuridade, contradição ou omissão. O acórdão recorrido se manifestou sobre todos os pontos suscitados nas apelações, inclusive os vários temas enumerados nas razões recursais e reputados de omissos ou contraditórios, alcançando solução tida como a mais justa e apropriada para a hipótese vertente. A prestação jurisdicional dada, portanto, corresponde àquela efetivamente objetivada pelas partes, sem omissão a ser sanada, tampouco contradição a ser aclarada. O Tribunal não está obrigado a julgar a questão posta a seu exame nos termos pleiteados pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento, consoante dispõe o art. 131 do CPC, utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência, aspectos pertinentes ao tema e da legislação que entender aplicável ao caso. Por outro lado, já é pacífico o entendimento no STJ, e também nos demais Tribunais Superiores, de que os embargos declaratórios, mesmo quando manejados com o propósito de prequestionamento, são inadmissíveis se a decisão embargada não ostentar qualquer dos vícios que autorizariam a sua interposição (AgRg no Ag 680.045⁄MG, 5ª Turma, Rel. Min. Félix Fischer, DJ de 03.10.2005; •••

(STJ)