ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PROMITENTE VENDEDOR EM EXECUÇÃO FISCAL DE IPTU
1. Introdução A inclusão do promitente vendedor no polo passivo de execuções fiscais de IPTU tem despertado bastante polêmica, especialmente no tocante às empresas loteadoras e incorporadoras. Neste artigo, pretendemos abordar alguns pontos sobre o tema, especialmente a recente decisão do Recurso Especial nº 1.111.202-SP1, Relatado pelo Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/06/09, que decidiu o assunto em caráter de recurso repetitivo, culminando com a edição da Súmula 399 do STJ2, e a Lei nº 11.977/093 que, além de dispor sobre o Programa Minha Casa Minha Vida, promoveu importante alteração procedimental em relação ao proprietário do domínio pleno ou útil, inclusive do promitente vendedor ou do fiduciário, nos casos de cobrança e/ou execução de dívidas decorrentes do uso do imóvel. 2. A formalização dos negócios imobiliários Nas transações imobiliárias, é muito comum se formalizar o negócio por meio de um contrato de promessa ou compromisso de venda e compra, no qual se ajustam as condições do negócio tais como o imóvel objetivado, preço, forma de pagamento, transmissão da posse, responsabilidade por pagamento de impostos etc. Tal fato se deve ao custo de transferência do imóvel que, nos termos do art. 108 do Código Civil4, deve ser feito por escritura pública, ressalvada a hipótese de imóvel cujo valor seja inferior a 30 vezes o maior salário mínimo. Além das despesas com a transmissão, a preferência pelo instrumento particular se deve à facilidade de rescisão em caso de descumprimento do ajustado, considerando que o desfazimento do negócio entabulado por escritura pública somente por esta pode ser desfeito. Seja por qual motivo for, o fato é que a transação imobiliária realizada mediante compromisso de venda e compra está disseminada no mercado, especialmente nos casos de loteamentos e incorporações imobiliárias. Tal prática acarreta sérios problemas para o promitente vendedor, tendo em vista que continua constando no registro de imóveis como proprietário do bem, mas já se comprometeu a vendê-lo de modo irretratável e irrevogável, inclusive entregando sua posse ao promitente comprador. Ocorre que, muitas vezes, o adquirente não se dispõe a pagar os impostos e taxas incidentes sobre a transação, a fim de se lavrar a competente escritura definitiva de venda e compra, com o consequente registro no Cartório de Imóveis. Essa a razão pela qual o imóvel continua registrado em nome do vendedor e, por isso, em determinadas localidades, a Fazenda Pública Municipal (FPM) ajuíza a ação de execução fiscal em face do proprietário que consta no Registro de Imóveis, isolada ou conjuntamente contra o comprador. Cumpre ressaltar que, em boa parte dos casos, a FPM tem plena ciência da alienação do imóvel pelo vendedor, pois muitas vezes é informada da transação, quer por comunicação do comprador, quer pelo requerimento de aprovação de projeto de construção formulado pelo adquirente do imóvel, nos casos de loteamentos urbanos. Diante de sua inclusão no polo passivo da execução fiscal, o vendedor, via de regra, ingressa com exceção de pré-executividade ou embargos, a fim de ser excluído do processo, tendo em vista a alienação do imóvel ocorrida antes do fato gerador do tributo objeto de cobrança. Entretanto, muitas decisões são favoráveis à manutenção do vendedor no polo passivo da execução fiscal, com base na alegação de que o sujeito passivo do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular de seu domínio, ou o possuidor a qualquer título, nos termos do art. 34 do Código tributário Nacional5, podendo a FPM exequente direcionar a execução fiscal contra qualquer deles, elegendo o sujeito passivo do tributo, sendo irrelevante a negociação do imóvel já contratada. Tal entendimento foi referendado pela decisão do Recurso Especial nº 1.111.202-SP, Relatado pelo Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/06/09, e pela Súmula 399 do STJ, que serão abordados mais adiante. 3. Ilegitimidade passiva do promitente vendedor Em que pese o entendimento do STJ, ousamos divergir no tocante à inclusão ou manutenção do promitente vendedor no polo passivo de execução fiscal de tributos cujos fatos geradores tenham ocorrido após a celebração do compromisso de compra e venda. Entendemos que a execução deveria ser ajuizada apenas em face do promitente comprador, tendo em vista que este último é o único responsável pelo pagamento dos impostos incidentes sobre o imóvel alienado, devendo-se excluir o vendedor destas demandas, considerando sua absoluta ilegitimidade passiva, especialmente nos casos em que a alienação tenha sido efetivada muitos anos antes da ocorrência do fato gerador e comunicada à FPM. A sujeição passiva é uma qualidade do sujeito de direito aferida em função da ocorrência do fato gerador do tributo, correspondente ao fato ou ato jurídico realizado ou a ser praticado. Em execução fiscal, não é legítima a inclusão do promitente vendedor de imóvel no polo passivo da demanda, visto que não é mais proprietário do imóvel em questão, vez que o alienou a terceiro, que inclusive possui o direito real, nos termos do inciso VII, do artigo 1.225 do Código Civil6, não compondo a sujeição passiva na cobrança do IPTU, ainda que não registrada a transferência do referido imóvel para o atual proprietário junto ao Registro de Imóveis, especialmente quando a FPM teve ciência inequívoca da transferência da propriedade do imóvel, o que pode se dar mediante comunicação expressa das partes contratantes, requerimento de aprovação de projeto etc. Tal entendimento tem fundamento no art. 34 do Código Tributário Nacional, assim redigido: Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.7 Tal dispositivo informa a sujeição passiva do IPTU e a consequente responsabilidade pelo pagamento do débito, dispondo que a cobrança do imposto recai sobre o proprietário, o titular do domínio “OU”o possuidor do imóvel, o que implica dizer que a FPM deve escolher qual dos sujeitos passivos pretende cobrar, haja vista a conjunção alternativa “ou”, pois, se lhe fosse facultada a possibilidade de cobrança de todos os sujeitos passivos, deveria estar presente a conjunção aditiva “e”, o que não é o caso. Ora, partindo-se do princípio de que para o legislador não há palavras inúteis na lei, é evidente que a existência da conjunção alternativa “ou” implica na obrigação da FPM de ingressar com a Execução fiscal apenas em face de um dos sujeitos passivos descritos no art. 34 do CTN. Dessa forma, considerando os casos em que a FPM tem ciência da alienação do imóvel para o promitente comprador, conforme exposto anteriormente, e considerando que o art. 34 do CTN permite a cobrança do IPTU do possuidor do imóvel a qualquer título, é de rigor que se imponha à municipalidade cobrar o tributo daquele que efetivamente vem exercendo a posse do imóvel e que poderá ser dela desprovido em razão de eventual alienação judicial do imóvel para pagamento do tributo. Ainda, pelo princípio da legalidade estrita8, a Administração Pública deve atuar nos estritos termos da lei, de modo que, se o •••
Thiago Leal de Paula (*)