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BDI Nº.25 / 2009 - Assuntos Cartorários Voltar

OS LIVROS 4 E 5 DO REGISTRO IMOBILIÁRIO. OS INDICADORES REAL E PESSOAL

1. Introdução A Lei Federal 8.935, de 18 de novembro de 1994, define, em seu artigo primeiro, que “Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos”. Destes fins colimados pelo sistema registral, quais sejam, a publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos, neste trabalho queremos destacar a publicidade que, para nós, é mesmo a quintessência do registro imobiliário, já que sua construção e operação só se justifica, em nosso atual estágio de desenvolvimento sóciojurídico, se o que consta dos seus assentamentos destina-se a ser conhecido pela coletividade. Essa possibilidade torna-se, segundo pensamos, conditio sine qua non da concretude da função social da propriedade, consagrada no artigo 5º, XXIII, da Carta Política de 1988 e, no âmbito do direito civil, enfatizada no artigo 2.035, parágrafo único, do estatuto civilista de 2002. Esta afirmação decorre, em fundamentação breve temporis, da circunstância de que a clandestinidade, o oculto, conspiram contra a efetividade e objetivação da função social da propriedade. É direito da sociedade, assim, conhecer a extensão e os limites dos direitos reais sobre imóveis e eventuais outros ônus sobre eles incidentes, seja para melhor embasar suas decisões de praticar ou não determinado negócio jurídico, seja para municiar com elementos robustos as instituições encarregadas de formular políticas públicas ou exercer poder de polícia que direta ou reflexamente recaiam sobre a propriedade imobiliária. Ademais, ao publicar o direito, protege-se também o direito individual do proprietário, já que cria uma obrigação negativa para todo o resto da coletividade de não embaraçar o livre exercício desse direito por seu titular, dentro dos seus contornos legais. Essa obrigação de respeitar a propriedade interessa também a toda a sociedade e à manutenção da ordem jurídica, porque leva o cidadão à certeza de que, se o Estado protegerá o proprietário contra ataques desautorizados pela lei por parte de terceiros, também o protegerá quando, a seu turno, sua propriedade estiver ameaçada. Nesse sentido, o Registro de Imóveis tem por escopo concentrar as informações acima referidas de sorte a proporcionar mecanismos de fácil recuperação das mesmas, tendo, assim, a vocação de ser a longa manus da função social da propriedade. De nada adiantaria realizar um trabalho com extrema correção técnico-jurídica, tornando seus assentamentos um repositório seguro a espelhar a situação da propriedade imobiliária na coletividade, se essa informação não pudesse ser recuperada com eficiência e segurança. Não se pode descurar que a expressão “publicidade registral” sai do campo das idéias e da abstração e se concretiza ao se instrumentalizar a informação na forma de uma “certidão”, disciplinada nos artigos 16 a 21 da Lei de Registros Públicos, no Capítulo V que, sugestivamente, leva a rubrica “da publicidade”. Esta singela peça sintetiza o clímax da atividade registral-imobiliária: após percorrer todo o iter do negócio jurídico-imobiliário, que passou pela confecção do título causal, ingresso e qualificação no Registro de Imóveis, com o consequente registro, se em termos, chega-se finalmente ao documento que prova e informa o direito. Embora o direito tenha sido constituído ou declarado pelo ato registral em si, ele seria inútil se não se destinasse ao conhecimento de todos os interessados. Pois bem. Quais são os instrumentos instituídos pela Lei de Registros Públicos para permitir essa recuperação de informações? São os dois livros conhecidos como “indicadores”, previstos no artigo 173, respectivamente nos incisos IV e V: os chamados Livro nº 4, denominado “Indicador Real”, e Livro nº 5, ou “Indicador Pessoal”. Pelo que ficou dito até aqui já se vislumbra a inafastável importância desses dois livros no sistema registral-imobiliário vigente, colaboradores que são no funcionamento dos livros principais, conforme assevera Miguel Maria de Serpa Lopes [01]. Da sua escorreita escrituração decorrerá o sucesso ou o fracasso dos fins perseguidos pelo registro imobiliário. Ulisses da Silva afirma que “eles são as portas abertas, no Registro de Imóveis, por onde entramos, em nossa pesquisa, para chegarmos a uma matrícula ou um registro [...] Dada a importância da função de tais livros, logo se vê a necessidade de bem escriturá-los”. [02] Assim ressaltada a relevância do tema, examinemos em seguida os requisitos da escrituração desses dois livros. 2. Abordagem legal e normativa Por primeiro, convém ressaltar que a atividade registral-imobiliária é fortemente influenciada por disposições normativas emanadas dos órgãos censório-fiscalizatórios, integrantes do Poder Judiciário, que têm a função de discipliná-la. Essa atribuição decorre da própria lei. A já referida Lei Federal 8.935/94, verdadeiro Estatuto dos Notários e Registradores, determina no seu artigo 28, inciso XIV, ser dever destes últimos “observar as normas técnicas estabelecidas pelo juízo competente”. Tanto é assim que deverá, também, “manter em arquivo as leis, regulamentos, resoluções, provimentos, regimentos, ordens de serviço e quaisquer outros atos que digam respeito à sua atividade” (inciso IV). Não satisfeito, o mesmo diploma legal ainda elenca entre as infrações disciplinares, que sujeitam os notários e os oficiais de registro às penalidades previstas no mesmo, “a inobservância das prescrições legais ou normativas” (art. 31, I). O “juízo competente” é o estadual ou distrital (art. 37) e sua correta identificação, portanto, dependerá das Leis de Organização Judiciária de cada Estado-membro. No Estado de São Paulo, essa atribuição é dos chamados “juízes corregedores permanentes” e, sobreposta hierarquicamente a eles, da Corregedoria Geral da Justiça, formando assim duas instâncias administrativas. É o que se depreende dos preceitos contidos nos artigos 50 a 52 do Decreto-Lei Complementar nº 3, de 27 de agosto de 1969 (Código Judiciário do Estado de São Paulo), e do item 4, capítulo XIII, do Provimento CG 58/89 (Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo). Lembre-se quanto a isso que, com relação ao tema sub exame, o Poder Judiciário não atua em sua função jurisdicional típica, mas exerce atribuição administrativa anômala. Há que se fazer referência também ao CNJ – Conselho Nacional da Justiça -, criado pela Emenda Constitucional nº 45/04, que o incluiu como órgão componente do Poder Judiciário, conforme se vê do artigo 92, inciso I-A, da CF/88. Este Conselho, dentre outras atribuições, inclusive a de conhecer de reclamações contra serviços notariais e de registro (art. 103-B; § 4º, inciso III, CF/88), pode também, no zelo pela observância das amplas regras contidas no artigo 37 da Carta Maior, desconstituir ou rever atos administrativos praticados pelo Poder Judiciário. O alcance das atribuições do CNJ permite entrever no mesmo – segundo pensamos – uma terceira instância administrativa, ou, mais propriamente, uma instância de superposição, já que pode conhecer diretamente dos temas aqui ventilados, até mesmo de ofício, ou avocar procedimentos em curso, nos termos dos mesmos preceptivos constitucionais citados. Assim, ao notário e ao registrador não basta cumprir a lei stricto sensu: deverá também atentar se há disposição normativa, emanada dos órgãos aludidos, disciplinando cada fração de sua atividade. No Estado de São Paulo, são amplamente conhecidas as chamadas “Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça”, atualmente consubstanciadas no Provimento CG nº 58/89 e que – advirta-se – estão em fase de atualização por parte daquele órgão. Colocadas essas premissas, prosseguiremos o exame dos indicadores, sempre atentando não só para a Lei de Registros Públicos, mas também para as “Normas da Corregedoria”. 3. O Livro 4: o indicador real O anterior diploma legal disciplinador do registro de imóveis, o Decreto nº 4.857, de 09 de novembro de 1939, já previa em seu artigo 186 a existência do livro destinado ao indicador real, que sob sua égide recebia o número 6. A sua escrituração era feita por lançamentos sequenciais, embora o livro devesse ser repartido, por igual, entre as circunscrições que compusessem a “zona pertencente ao respectivo cartório”. Assim, todos os imóveis referidos direta ou indiretamente nos atos de registro, termo esse usado aqui em sentido amplo, lançados nos Livros 2 (inscrição hipotecária), 3 (transcrição das Transmissões), 4 (Registros Diversos) e 8 (Registro Especial), deveriam ser indicados no Livro 6, que para tanto era dividido em cinco colunas, a saber: 1) denominação do imóvel, se rural; 2) menção da rua e do número, se urbano; 3) nome do proprietário; 4) referências aos números de ordem e páginas dos demais livros, e 5) anotações. Por óbvio que simplesmente manter livros escriturados em sequência de nada adiantaria no momento de efetuar uma busca. Daí que o diploma anterior previa, em seu artigo 189, que o registrador mantivesse um índice auxiliar, que deveria ser organizado em ordem alfabética, o que se conclui da circunstância •••

Luciano Lopes Passarelli (*)