A IMPENHORABILIDADE DO DIREITO REAL DE USUFRUTO
O tema agitado pelo Dr. Ademar Fioranelli, mestre de todos nós, me fez buscar alguns apontamentos para enquadrar melhor o tema da impenhorabilidade do direito real de usufruto, experimentando exegese dos artigos 1.393 do NCC , em conexão com o 649, I, do CPC. O Dr. Ademar Fioranelli acenou para a impossibilidade de registro de penhora de direito real de usufruto, embora consentisse com a penhora sobre o exercício do usufruto, caso contenha expressão econômica. O artigo 649, I, do CPC elenca como expressamente impenhorável o bem inalienável. Consabido que o usufruto é inalienável e que da inalienabilidade resulta a impenhora-bilidade, logo o direito real de usufruto é impenhorável. Sendo, portanto, absolutamente impenhorável o direito real de usufruto, o registro que se fizesse da penhora seria irremediavelmente contaminado com a nulidade do ato. Conforme procurou demonstrar o registrador paulistano, o usufruto só se pode transferir, por alienação, ao proprietário da coisa. Admitido que fosse o registro da penhora do usufruto, a completar-se o iter lógico da execução, tal direito seria levado a praça e eventualmente arrematado, concretizando, assim, o sucedimento subjetivo que a lei expressamente veda. A razão de ser impenhorável o usufruto é simples: sendo um direito com caráter personalíssimo – uma servidão pessoal como o qualifica Clóvis Beviláqua – é contrário à sua essência torná-lo alienável. (Comentário ao Código Civil, nota ao art. 717 do antigo código). Logicamente se pode concluir que o sistema experimenta uma exceção que sanciona a alienação do usufruto: ao próprio dominus poderá ser alienado o direito real de usufruto, consolidando assim as faculdades que compõem o feixe dominial. Visto que o usufruto não pode ser alienado, salvo ao proprietário, indaga-se: poderá ser penhorado o direito do usufruto? Responde Carvalho Santos: “o direito de usufruto não pode ser objeto de penhora, como conseqüência da sua inalienabilidade. O exercício desse direito, porém, pode ser penhorado, consoante doutrina geralmente admitida e sancionada por pacífica jurisprudência”. (Código Civil Brasileiro interpretado, 16a ed. Vol. IX, São Paulo : Freitas Bastos, p. 368). E prossegue o festejado civilista: “sobre essa questão tivemos ocasião de escrever, em arrazoado, o seguinte: ´toda a questão, que tanto tem sido protelada em seu julgamento pelos inesgotáveis recursos de uma desenfreada chicana, se resume nisto: poderá ser penhorado o exercício do direito de usufruto?’ Para chegar à conclusão a que chegou, precisou o nobre ex adverso esquecer que direito de usufruto é uma coisa e exercício desse é coisa diversa. É o próprio Clóvis, a cuja autoridade se pretendem amparar os embargantes, mas, contraproducentemente, quem nos ensina que o usufruto é inalienável, acrescentando em seguida que o exercício desse direito, porém, pode ser transferido (Cód. Civ. Com., ob. ao art. 717) . A razão é óbvia. O usufrutuário pode vender ou ceder o seu direito, mas essa cessão ou aquela venda dizem respeito, antes aos rendimentos que pode produzir do que ao próprio direito; porque sendo este ligado à pessoa do usufrutuário não pode ser cedido. Ele subsiste, pois, na pessoa do usufrutuário, não obstante a alienação, e se se trata de cessão por tempo determinado o mesmo se verifica, voltando o usufrutuário a perceber também os rendimentos, logo que seja vencido o prazo do contrato (Cfr. POTHIER, Traité du contract de vente, § 549). É fácil explicar tudo isso, que, à primeira vista, pode parecer mera sutileza, obscura e confusa como quase todas elas. O direito de usufruto é ligado à pessoa do usufrutuário como um desmembramento do domínio que é na realidade, não podendo ser transferido justamente porque essa transferência redundaria em violação do contrato ou ato, do qual resultado aquele desmembra-mento. E se o nu proprietário tem direito a adquirir o domínio pleno, logo que faleça o usufrutuário, se fosse possível a transferência do direito de usufruto, ele correria o risco de nunca mais adquirir a plena propriedade, bastando para tanto que o usufrutuário, ao pressentir a morte, transferisse seu direito a outro mais moço, e com mais vida, e assim por diante. Com a transferência do simples exercício •••
Sérgio Jacomino (*)