REINTEGRAÇÃO DE POSSE – EXTRAPOLAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA CONSTRUÇÃO AO INVADIR ÁREA PÚBLICA – AUTORIZAÇÃO CANCELADA – OCUPAÇÃO IRREGULAR – NÃO RECONHECIDOS DIREITOS À INDENIZAÇÃO E À RETENÇÃO DE BENFE
Recurso Especial nº 807.970 - DF (2005/0215436-0) Relator: Ministro José Delgado EMENTA Administrativo. Recurso Especial. Reintegração de posse. Extrapolação de autorização para construção. Invasão de área pública. Autorização cancelada. Direitos à indenização e à retenção de benfeitorias não-reconhecidos. Ocupação irregular. Má-fé. 1. Cuidam os autos de ação de reintegração de posse proposta pelo Distrito Federal em desfavor de Dalmo Josué do Amaral e Ana Amancia do Amaral, de área pública adjacente à propriedade dos réus, bem como requerendo a sua condenação ao pagamento de taxa de ocupação. A sentença julgou procedente o pedido. A apelação dos réus foi julgada por maioria, tendo o voto da Relatora consignado que os réus não podem alegar que a sua posse era de boa-fé na medida em que sempre souberam estar ocupando terra pública, insuscetível de posse, não lhes assistindo, portanto, direito de indenização. O voto médio, porém, concedeu o direito à indenização pelas benfeitorias, por meio de liquidação por arbitramento, mantendo a sentença no mais. Interpostos embargos infringentes pela parte ré e recurso adesivo pelo Distrito Federal. Desta feita, foram não-providos os infringentes dos réus e providos os do Distrito Federal, adotando-se a tese pelo não-reconhecimento do direito à indenização. Embargos de declaração foram opostos pelos réus, tendo sido não-providos. Apenas determinou-se a correção de erro material no julgamento dos embargos infringentes: foi por unanimidade e não por maioria. Recurso especial dos réus insistindo que a ocupação da área pública se deu de boa-fé, sendo merecedores da indenização pleiteada, além de requererem a anulação do ato que cancelou a Carta de Habite-se, provocadora do pedido de reintegração. Alegam violação dos arts. 449 até 519 do Código Civil; e 267, I e IV, e 535, I e II, do CPC. Contra-razões ao Especial pugnando a manutenção do aresto objurgado. Inadmitido o apelo nobre, subiram os autos por força de êxito de agravo de instrumento. 2. O presente caso retrata situação em que, embora os réus tenham sido autorizados a elaborar obras e construções em terreno privado, extrapolaram tal consentimento e construíram em área adjacente pública. 3. Não há que se falar em negativa de vigência do art. 267, I e IV, do CPC, como querem fazer crer os recorrentes, ao sustentarem a extinção do feito sem julgamento de mérito por não poder a Administração invocar a via da reintegração de posse para retomar área pública, em razão da inexistência jurídica da própria posse. O Distrito Federal possui interesse e utilizou a via adequada. Houve cancelamento do ato administrativo que concedeu a Carta de Habite-se, passando os réus à qualidade de esbulhadores ao ocuparem, conscientes, área pública. O interdito possessório é o meio adequado para a obtenção da tutela vindicada. 4. Ficou caracterizado e bem destacado no julgamento de segundo grau que a ocupação exercida sobre o bem público foi de má-fé, sendo incontroverso que os réus não ignoravam o vício ou o obstáculo que lhe impediam a aquisição do bem ou do direito possuído, qual seja, a propriedade pública do imóvel. A posse de boa-fé só deixa de existir quando as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente. Direito à indenização repelido. 6. Recurso especial não-provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux, Teori Albino Zavascki e Denise Arruda votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 19 de setembro de 2006 (Data do Julgamento) Ministro José Delgado, Relator RELATÓRIO O Sr. Ministro José Delgado (Relator): Trata-se de recurso especial interposto Por Dalmo Josué do Amaral e Ana Amancia do Amaral (fls. 280/312), com fulcro no art. 105, III, “a”, da CF/88, contra acórdão prolatado pelo TJDFT, assim ementado (fl. 162): “AÇÃO INTERDITAL – POSSESSÓRIA CUMULADA COM PERDAS E DANOS – BENS PÚBLICOS DOMINICAIS – PERMISSÃO DE USO E CONSTRUÇÕES – DIREITO INDENIZATÓRIO RECONHECIDO, MAIORIA – CONDIÇÕES DA AÇÃO – PRELIMINARES REJEITADAS, MAIORIA – RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS PELO VOTO MÉDIO – Desde que sobrelevante o laço conectivo entre as partes, indiscutível o interesse processual a uní-las no processo. O esbulho possessório, como fato, pode caracterizar-se em área pública e a legitimidade da Administração sempre transborda na defesa de seu patrimônio. Maioria. A posse é um fato e esse fato alcança, inclusive a área pública, dele não há como se esconder, mas se houve prévia permissão de uso e construção de obras, ainda que haja extrapolamento da área construída, a tolerância da Administração pode e gera sobre os bens dominicais, direitos de ressarcimento, especialmente o direito de retenção no caso da reivindicatória.” Tendo o julgado sido proferido por maioria de votos, foram apresentados embargos infringentes, cujo julgamento desta forma restou sintetizado (fl. 243): “EMBARGOS INFRINGENTES. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TERRA PÚBLICA. DIREITO À INDENIZAÇÃO. Não se afastando a precariedade da ocupação de área pública, não há como conceder proteção possessória, sendo o caso de se presumir a má-fé na ocupação do imóvel público. Direito à Indenização indeferido.” Face ao acórdão dos embargos infringentes foram opostos embargos de declaração, que restaram assim espelhados (fl. 269): “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL – OMISSÃO – ANÁLISE FÁTICA. 1. Os Embargos de Declaração constituem-se meio próprio para a correção de erro material. 2. Não configura omissão no v. acórdão a eleição de apenas alguns dos fatos mais relevantes para a lide. O julgador, neste ponto, acha-se obrigado a analisar a questão de fundo, não sendo necessário esgotar o exame fático que envolve a demanda.” Cuidam os autos de ação de reintegração de posse proposta pelo Distrito Federal em desfavor de Dalmo Josué do Amaral e Ana Amancia do Amaral, de área pública adjacente à propriedade dos réus (Lote nº 19, QL 08, Conjunto 01, SHI/Sul, Brasília), bem como a sua condenação ao pagamento de taxa de ocupação. O pedido foi consignado nos termos seguintes (fl. 06): “a) a promover às suas expensas - sob pena de ser feita às custas da Administração Pública do Distrito Federal, para posterior ressarcimento, pelos Réus, dos gastos respectivos -, no prazo certo de 15 (quinze) dias, a plena desocupação da área pública invadida, com sua integral restauração ao status quo original; b) à satisfação de perdas e danos, consistentes no valor devido, a título de Taxa de Ocupação, segundo padrões vigentes no Distrito Federal para a permissão de ocupação de área pública, pelo uso do imóvel invadido, por todo o tempo que tiver durado a ocupação; c) ao pagamento da importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por dia de ocupação, como pena cominada para o caso de nova turbação ou esbulho; d) ao pagamento de honorários advocatícios, das custas processuais e de juros e correção monetária cabíveis.” A sentença julgou procedente o pedido para “determinar a reintegração do autor na posse da área pública ocupada, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de ser feita a desocupação pela Administração Pública, com posterior ressarcimento das despesas. Para o caso de nova turbação ou esbulho, fixo a multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por dia de ocupação”. Condenou, ainda, os réus “ao pagamento da taxa de ocupação, segundo os padrões vigentes no Distrito Federal para a permissão de ocupação de área pública, pela utilização da área ocupada, relativa ao tempo em que se utilizaram da mesma”. Em apelação (fls. 129/142) os réus pugnam pela reforma da sentença sob a alegação de que as obras foram realizadas com autorização do Poder Público e sob o manto da posse de boa-fé. O apelo foi julgado por maioria (fl. 162), tendo o voto da Relatora consignado que os réus não podem alegar que a sua posse era de boa-fé , na medida em que sempre souberam estar ocupando terra pública, insuscetível de posse, não lhes assistindo, portanto, nenhum direito de indenização. O voto médio, porém, concedeu o direito à indenização pelas benfeitorias, por meio de liquidação por arbitramento, mantendo a sentença quanto ao restante. Apresentados embargos infringentes (fls. 181/196), estes foram devidamente contra-arrazoados (fls. 200/205), havendo, ainda, recurso adesivo interposto pelo Distrito Federal (fls. •••
(STJ)