LOCAÇÃO DE ESPAÇOS EM SHOPPING CENTER: PARECER JURÍDICO
(Contrato atípico, que não envolve somente a locação) Sérgio Wainstock (*) Preliminarmente, faremos algumas considerações de ordem jurídica sobre a locação de espaços em Shopping Center que, a nosso ver, não se trata, tão somente, de um contrato de locação de imóvel, quer regido pelo Código Civil (art. 1.188 e segs.), quer regido mesmo pela Lei nº 8.245/91. O contrato celebrado entre o dito empreendedor do Shopping Center e o titular de uma unidade autônoma pode apresentar semelhança com a locação de imóvel urbano, mas que dele também se distingue por seus elementos constitutivos, por suas peculiaridades e por sua natureza jurídica. Ele se parece com a locação no ponto em que uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo da coisa mediante certa retribuição. Vislumbramos, em conseqüência, na cessão de uso e gozo de área nos shoppings um negócio jurídico regido por quatro contratos que formam uma unidade incindível para a qual propõe o nomen juris de “contrato atípico de locação”, que, a nosso ver, não se subsume, tão só, a uma lei de locação. Cumpre ressaltar que as partes, ao concluírem o negócio jurídico, assinam quatro instrumentos, que se integram em uma unidade jurídica, expressando a sua declaração de vontade: a) um contrato de locação; b) um Regimento Interno do Shopping Center; c) uma convenção que estabelece normas gerais de locação, administração, funcionamento, fiscalização e outras; d) e a participação na associação de lojistas. Como um desses instrumentos é designado de contrato de locação, este nomen juris deve ter exercido grande influência na conceituação do negócio jurídico celebrado pelas partes. Alguns shopping centers começaram a argüir, nas renovatórias que lhes moveram seus lojistas, a preliminar de carência da ação, sob fundamento de inexistência de relação ex locato e de fundo de comércio pertencente aos autores. E apesar de a jurisprudência tradicional admitir, como principal, o contrato de locação no conjunto de avenças entre os litigantes, existem decisões de primeiro e segundo graus inclinando-se pela tese da inexistência de locação e trancando liminarmente algumas ações renovatórias. A título de exemplo, podem ser citados o acórdão da Eg. 7ª C. do TACRJ, no AI 00098, sendo relator o Juiz GUALBERTO GONÇALVES DE MIRANDA, secundado pelos votos dos juízes PEDRO FERNANDO LIGIERO e AMAURY ARRUDA. No momento, predomina, nos Tribunais, o entendimento segundo o qual a renovação judicial do contrato entre o lojista e o shopping center deve continuar sob a égide da Lei nº 8.245/91, desde que, evidentemente, atenda aos requisitos do art. 71 do referido diploma legal. E como tudo está indicando que será esse o entendimento que vai predominar ainda por muito tempo, cumpre conciliar os interesses globais do shopping, que é uma comunidade de lojistas, com os do lojista isoladamente considerado. Nesta conciliação, é curial a predominância dos interesses da maioria, motivo pelo qual, nas ações renovatórias do contrato, terá o juiz de admitir defesas que em outras circunstâncias teriam de ser repelidas, mas que são perfeitamente adequadas quando sustentadas pelo shopping, como locador, em face das singularidades que caracterizam o contrato de ocupação das lojas e espaços do edifício. Em outras palavras, aplicar-se-á à Lei nº 8.245/91 os necessários ajustamentos à relação jurídica peculiar aos shoppings. De qualquer modo, nas contestações às ações renovatórias, os shoppings têm apresentado preliminares de carência da ação por motivos impensáveis no caso de lojas autônomas, tais como: a) porque o lojista não conseguiu durante o contrato manter o volume de vendas, deixando de aproveitar a estratégia montada com a finalidade de otimizar todos os estabelecimentos comerciais do conjunto; b) porque o ramo explorado na loja se revelou desinteressante, e por isso, tem de ser substituído por outro que melhor se integre no complexo mercadológico do shopping; c) porque se tornou mais conveniente destinar o espaço ocupado pela loja a estacionamento, lazer ou fins análogos capazes de atrair para o conjunto maior número de freqüentadores; d) e até para que no local se instale outro estabelecimento com o mesmo ramo, mas gerenciado por alguém capaz de gerar vendas mais altas e, conseqüentemente, pagar aluguel maior do que o pago pelo ocupante anterior. Tais defesas podem ser vistas como ditadas pela necessidade de permanente reciclagem dos espaços comercialmente mal aproveitados. Sendo o criador e gestor do fundo de comércio global, o shopping qualifica-se para retomar e reorientar o aproveitamento comercial dos espaços que, por qualquer razão, se tornaram improdutivos, pois a produtividade constitui a diretriz inflexível dessa moderna espécie de macrocomércio. Em suma, para manter o dinamismo inerente aos shoppings, o empreendedor precisa contar com a faculdade de alterar •••
Sérgio Wainstock (*)