ARRAS, CONTRATOS PRELIMINARES E PROMESSAS DE COMPRA E VENDA – II PARTE (FINAL)
Eduardo de Assis Brasil Rocha (*) 4. Dos requisitos dos Contratos de Promessa de Compra e Venda (...) – Vontade: Por último, a vontade representa o elemento subjetivo, o querer, responsável pela declaração nos negócios e pela manifestação nos atos jurídicos. São considerados como vícios de vontade: Erro34, Dolo35, Coação36, que continuam com as mesmas características e tratados como hipótese de anulação. A Fraude Contra Credores37 também continua sendo tratada como caso de anulação (Arts. 158 a 165), embora fosse melhor enquadrada como situação de ineficácia. O NCC possibilitou a propositura da ação pauliana por outros credores, que não apenas os quirografários. A Simulação38 também manteve as mesmas características, passando, no entanto, a ser tratada como hipótese de nulidade (Art. 167 do NCC), quer seja inocente, quer seja maliciosa. Foram acrescentados outros dois vícios de vontade, também tratados como hipótese de anulação: A lesão (Art. 157), que consiste na declaração de vontade em premente necessidade ou inexperiência, desconhecida da outra parte, quando da realização de negócio desproporcional entre a prestação e a contraprestação, sendo possível a suplementação de dita prestação, ou da contraprestação, para equilibrar o contrato e evitar a sua anulação. O estado de perigo (Art. 156), que consiste na declaração de vontade também em premente necessidade, mas conhecida da outra parte, quando da realização de negócio excessivamente oneroso, não sendo possível, neste caso, a suplementação antes referida. 5. Da Inexecução da Promessa de Compra e Venda Os remédios jurídicos a serem utilizados, para a hipótese de não realização da compra e venda definitiva, são a ação de adjudicação compulsória e a ação condenatória de obrigação de fazer. – Adjudicação Compulsória: É o remédio processual que busca uma sentença substitutiva da vontade do promitente vendedor. A própria sentença em si mesma, já produz os mesmos efeitos da vontade não emitida pelo promitente vendedor. A carta de sentença, extraída após o trânsito em julgado da decisão, servirá de título hábil ao registro da transferência definitiva da propriedade, uma vez que coercitivamente substitui a vontade não emitida. Estava prevista na Art. 22 do Decreto-Lei nº 58/37 (imóveis não loteados) e no Art. 25 da Lei 6.766/79 (imóveis loteados). O entendimento inicial do STF era no sentido da obrigatoriedade do registro da promessa de compra e venda para o exercício da ação de adjudicação compulsória, conforme as Súmulas 167 e 168. Posteriormente, com a evolução doutrinária e jurisprudencial, passou-se a dispensar o registro das promessas de compra e venda no cartório imobiliário para efeitos da propositura da ação de adjudicação compulsória, uma vez que referida ação nada teria a ver com o direito real do promitente comprador decorrente do registro, mas sim, estaria fundamentada no direito pessoal gerado pelo próprio compromisso de compra e venda, proveniente de uma obrigação de fazer. Neste sentido foi editada a Súmula 239 do STJ, vazada nos seguintes termos: “O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”. 39 No entanto, a partir do NCC, em razão dos citados Arts. 1.417 e 1.418, s.m.j., têm-se entendido que a referida Súmula 239 do STJ estaria superada, perdendo a sua eficácia, na medida em que o direito do promitente comprador à aquisição do imóvel, como direito real, ficou expressamente condicionado ao registro no cartório imobiliário, e, evidentemente, ainda à inexistência de cláusula de arrependimento e ao pagamento do preço ajustado entre as partes. Assim, a ação de adjudicação compulsória, com o novo Código Civil, expressamente passa a decorrer do direito real à aquisição do imóvel, que requer, para tanto, o registro da promessa de compra e venda no Cartório de Imóveis. – Condenatória de Fazer: É o remédio que busca uma sentença condenatória do promitente vendedor a emitir declaração de fazer (outorga da escritura definitiva de compra e venda), em prazo fixado judicialmente, sob pena de não o fazendo a decisão produzir os mesmos efeitos da declaração não emitida, sendo isto possível e não excluído pelo título. Está previsto nos Arts. 639 e 641 do Código de Processo Civil40, cumulado como o Art. 461 do mesmo CPC 41. O Código de Defesa do Consumidor tem dispositivo no mesmo sentido a ser aplicado nos contratos que versem sobre relação de consumo42. A possibilidade não diz respeito ao registro da promessa de compra e venda, mas sim à inexistência de algum óbice à transferência definitiva da propriedade, ou seja, de que a sentença possa produzir os mesmos efeitos da vontade não emitida, como se fosse o próprio título. No entanto, haverá hipóteses em que não será possível a decisão produzir os mesmos efeitos da declaração não emitida, como por exemplo, se a coisa já tiver sido vendida a terceiros; houver um ônus sobre o imóvel impedindo a alienação; a coisa houver perecido; inexistências das devidas negativas, dentre outras43. Neste caso, a obrigação converter-se-á em perdas e danos, conforme Art. 461, § 1º do CPC. A distinção entre esta ação de condenação de obrigação de fazer e a de adjudicação compulsória já havia sido muito bem captada pelo professor HUMBERTO THEODORO JUNIOR44, em artigo intitulado “Condições de Procedibilidade para a Execução Específica do Compromisso de Compra e Venda”, in verbis: “O importante, porém, é atentar para o direito à execução forçada da obrigação de contratar, que não foi concebido no CPC para proteger o direito real, mas para assegurar meio idôneo de realizar, in natura, as obrigações de outorgar declaração de vontade. O direito real de aquisição sim, nasce da inscrição do contrato no Registro de Imóveis e só poderá ser exercitado “erga omnes”, através da ação de adjudicação compulsória quando se comprovar tal inscrição”. E acrescenta: “Em se cuidando, destarte, de execução de direito pessoal, a sentença criará para o credor, apenas um contrato e nada mais; um contrato sujeito a todas as vicissitudes por que teria de passar aquele definitivo que acaso fosse firmado pelo devedor, na hipótese de execução voluntária do pré-contrato”. Portanto, na ação de outorga de escritura não há que se exigir o prévio registro do compromisso de compra e venda, pois a sentença opera mera substituição da vontade do promitente vendedor, cumprindo em seu lugar a obrigação de formalizar o contrato de compra e venda prometido; enquanto na ação de adjudicação compulsória o registro imobiliário do pré-contrato se mostra imprescindível para surtir efeitos erga omnes, hipótese em que a sentença transfere a propriedade do bem, ao passo que, não havendo o prévio registro, produzirá efeitos apenas entre as partes, tão-somente substituindo a vontade do vendedor. 6. Da Rescisão da Promessa de Compra e Venda Rescisão é uma forma extintiva do contrato de promessa de compra e venda, por inadimplemento do promitente comprador, especialmente pela falta do pagamento do preço ajustado. Implica em descumprimento contratual, podendo ser cumulada com perdas e danos. Não se dá de pleno direito, mesmo que conste cláusula neste sentido, dependendo de prévia constituição em mora do promitente comprador. – Nos imóveis loteados, desde que a promessa de compra e venda esteja registrada no Cartório de Imóveis, a rescisão se dá administrativamente, após constituição em mora do devedor, realizada pelo próprio Oficial do Ofício Imobiliário. Não pago o preço, dentro de um prazo de 30 dias (Art. 36 da Lei nº 6.766/79), será considerado cancelada e rescindida a promessa de compra e venda. Problema surge quando o imóvel compromissado estiver na posse do promitente comprador. Neste caso, deverá haver uma ação de reintegração de posse ou mesmo ação reivindicatória. – Nos imóveis não loteados, com promessa registrada e, nos imóveis com promessa não registrada (loteados ou não), a rescisão judicial somente poderá ser feita judicialmente, através de ação de rescisão contratual, precedida de prévia constituição em mora45. A constituição em mora se dá através de Cartório de Registro de Títulos e Documentos, com prazo de 15 dias (Decreto-Lei nº 745, de 07.08.69). Esta notificação para a constituição em mora deverá ser a mais completa possível, indicando o valor devido, correção monetária, juros, honorários, custas, prazo e local para pagamento46. Se o promitente comprador estiver na posse do imóvel compromis-sado, a ação deverá ser cumulada com reintegração de posse. Tem-se admitido antecipação de tutela quanto à reintegração na posse47. Quanto à devolução do preço, por ocasião da rescisão das promessas de compra e venda48, devem ser observados alguns aspectos. É orientação pacífica que, tanto nos contratos regidos pelo Código de Defesa do Consumidor, como os da legislação civil comum, não é possível a perda de todas as parcelas do preço em razão da rescisão contratual, mesmo que exista cláusula contra-tual neste sentido49. Pode haver a retenção de uma quantia suficiente para cobrir as despesas do contrato desfeito50, via de regra, em torno de 10% das parcelas pagas. Existem, em casos específicos, retenções de 15%, •••
Eduardo de Assis Brasil Rocha (*)