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BDI Nº.3 / 2004 - Comentários & Doutrina Voltar

RATEIO DE DESPESAS NO CONDOMÍNIO - UMA QUESTÃO SEMPRE POLÊMICA

Kênio de Souza Pereira (*) O rateio de despesas para a fixação do valor da taxa de condomínio em edifícios comerciais, residen-ciais ou mistos ou em condomínios fechados pode se transformar em foco de atrito caso a convenção seja omissa em relação ao artigo 12, da lei 4.591/64, que “dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias”. De acordo com esse artigo “Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na convenção, a cota-parte que lhe couber em rateio.” Além disso, o § 1º estipula: “Salvo disposição em contrário na convenção, a fixação da cota no rateio corresponderá à fração ideal de terreno de cada unidade.” O problema se agrava quando se constata que mais de 70% das convenções de condomínios são repletas de erros que acabam criando normas injustas, ilógicas e ilegais. Esse conjunto de imperfeições motiva conflitos judiciais e desarmonia, problemas agora agravados pela redação do inciso I, do artigo 1.336 do novo Código Civil (CC). O dispositivo em questão determina que é dever do condômino “contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais”. Essa redação tem levado profissionais de competência reconhecida a afirmar que todas as convenções dos novos condomínios devem adotar obrigatoriamente a divisão daquelas despesas com base na fração ideal de cada unidade em relação ao terreno, ou seja, que a unidade maior deverá pagar sempre mais que a unidade menor. Há os que defendem a tese que até mesmo os condomínios antigos, que adotam critérios diferentes, deveriam a partir da entrada em vigor do novo CC, adotar a divisão das despesas com base na fração ideal. Esse entendimento reveste-se de fragilidade, pois a regra não é absoluta, já que a divisão das despesas com base na fração só é aplicável automaticamente na falta de outro critério estipulado de forma racional e justa, conforme as características do empreendimento. Por isso é recomendável que o profissional, ao tratar da matéria, fique atento às particularidades da construção e funcionamento do condomínio que será regulamentado, devendo observar os princípios jurídicos reguladores dessas complexas relações. O art. 1.334 do novo Código determina que: “Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados estipularam, a convenção determinará: I - a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender as despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;” O artigo 1.332 prevê nos seus três incisos os requisitos mínimos para se instituir o condomínio edilício, devendo constar na convenção, além do disposto em lei especial, a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; e o fim a que as unidades se destinam. O fato é que o artigo 12 da Lei 4.591/64 consagra há 38 anos a autonomia de os condôminos escolherem os critérios de divisão das taxas ordinárias e extraordinárias. Esses princípios de autonomia da vontade, justiça, equilíbrio e bom senso estão contidos no inciso I, do artigo 1.334 do novo Código Civil, que consagra a liberdade de se estipular na convenção como será o rateio das despesas, bem como a forma de administração; competência, convocação e quoruns das assembléias; sanções e o regimento interno. O inciso I do art. 1.334 do CC corresponde à expressão “salvo disposição em contrário na convenção” do § 1o do art. 12 da Lei 4.591/54. O legislador concede a liberdade de os condôminos utilizarem a capacidade intelectual para estipular a forma de divisão do rateio de despesas de maneira justa e racional. Assim, a regra da fração ideal, prevista no art. 1.336, só prevalecerá no caso de os condôminos abrirem mão da liberdade e autonomia autorizada pelo inciso I do art. 1.334 do CC. Essa liberdade justifica-se diante da diversidade de tipos de condomínios residenciais, comerciais e mistos. Torna-se impossível para o legislador prever uma única forma de divisão de despesas que atenda aos diversos tipos de empreendimentos imobiliários, às várias particularidades de cada conjunto de edificações, onde vemos condomínios compostos com diversos prédios e unidades de vários formatos e usos.. Convenção é subsidiária, não se sobrepõe à lei e aos princípios jurídicos A Lei 4.591/64 exige do incorporador apenas uma “minuta da convenção”, ficando para os condôminos e adquirentes das unidades elaborar, com a devida assessoria jurídica, a redação final da convenção. A lei estipula que os condôminos que representam 2/3 do condomínio podem elaborar, alterar e corrigir as falhas da convenção, bem como acrescentar as novidades trazidas pelo novo Código Civil. No entanto, a falta de profissionalismo originou escrituras de convenção mal redigidas, pois no intuito de reduzir custos, os construtores geralmente copiam um modelo de convenção para diversos edifícios, ignorando as peculiaridades de cada um. O resultado de uma convenção redigida por um engenheiro é o mesmo de um edifício projetado e construído por um advogado. Nenhuma convenção ou contrato pode se sobrepor aos princípios jurídicos e a lei, sendo o instrumento particular norma subsidiária desta. Havendo alguma norma convencional injusta, cabe ao Juiz a obrigação legal de declarar a sua nulidade, não podendo convalidar pactos lesivos, ilógicos e contrários à moral. É notório que a maioria das convenções são elaboradas por leigos cabendo ao Poder Judiciário repudiar as normas impostas sem base do conhecimento jurídico. A lei condena o enriquecimento ilícito e sem causa, mas convenções •••

Kênio de Souza Pereira (*)