LOCAÇÃO - TERRENO URBANO - DIREITO DE PREFERÊNCIA - AÇÃO DE NULIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA - AÇÃO DE DESPEJO - RECURSOS PROVIDOS
RECURSO ESPECIAL Nº 30.272-2 (92.31838-0) - CEARÁ Relator: O Exmo. Sr. Ministro Adhemar Maciel. Recorrente: Construtora Colméia. Advogados: Drs. José Feliciano de Carvalho e outros. Recorrente: João Gomes Grangeiro e Cônjuge. Advogados: Drs. Júlio Carlos Crispino L. Filho e outros. Recorrido: Agromar - Agricultura e Pecuária Ltda. Advogado: Dr. Vilebaldo Monteiro. Advogado: Dr. Joaquim Jair Ximenes Aguiar. EMENTA Locação. Terreno urbano. Direito de preferência (Lei nº 6.649/79, art. 24, § 2º). Ação de nulidade de escritura pública, cumulada com ação de depósito de contra-oferta. Ação de despejo. Recursos especiais providos pelas alíneas a e c, III, do art. 105 da Constituição. I - Um terreno urbano de 10.000m2, com um único registro imobiliário, foi dividido fisicamente no meio. Cada uma das unidades foi dada em aluguel a locatária diferente. No curso dos contratos de locação, os proprietários (segundos recorrentes) resolveram vender todo o imóvel. Notificaram as locatárias para que, no prazo de trinta dias, exercessem seus direitos de preferência pela compra de “todo o terreno”. Uma delas comprou todo o imóvel e o vendeu a terceiro (primeira recorrente). A outra locatária (recorrida), dentro do trintídio legal, contrapropôs comprar só a unidade por ela locada. Como o imóvel há havia sido vendido antes do advento dos trintas dias para o exercício da preempção, ajuizou ela ação de nulidade de escritura de compra e venda, cumulada com ação de depósito da contra-oferta. O terceiro adquirente de todo o imóvel (primeira recorrente), por seu turno, aforou ação de despejo. O juiz de primeiro grau una sententia julgou procedente a ação de despejo e improcedentes os pedidos de nulidade de escritura e depósito. A sucumbente recorreu. O TJ reformou a sentença. Entendeu, ao interpretar o § 2º do art. 24 da Lei nº 6.649/79, que há distinção entre “terreno urbano” e “unidade imobiliária”. II - Para efeito de preferência, não há distinção entre “terreno” (inclusive rural: Lei nº 4.504/64, art. 92, §§ 3º e 4º) e “unidade imobiliária” (Lei nº 6.649/79, art. 24, § 2º). In casu, o terreno formava uma unidade jurídica. Pouco interessa estivesse ele dividido fisicamente ao meio e dado em aluguel a duas locatárias diferentes. O proprietário não era obrigado a vender, ainda que pelo preço por ele estipulado, parte do imóvel para cada locatária. A notificação se fez para a compra in globo e não in partem. III - Recursos especiais providos. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento ao recurso especial por ambas as alíneas do dispositivo constitucional, vencido em parte o Sr. Ministro Vicente Cernicchiaro, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram de acordo os Srs. Ministros Anselmo Santiago, José Cândido e Pedro Acioli. Custas, como de lei. Brasília, DF., 25 de maio de 1993 Ministro José Cândido - Presidente. Ministro Adhemar Maciel - Relator. RELATÓRIO O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO ADHEMAR MACIEL: CONSTRUTORA COLMÉIA LTDA e JOÃO GOMES GRANGEIRO e seu CÔNJUGE, a primeira com arrimo nas alíneas a e c, e os segundos nas alíneas a e b do permissivo constitucional, interpuseram RECURSO ESPECIAL contra acórdão do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO CEARÁ. Senhor Presidente, antes de prosseguir na seqüência lógica, narrarei os fatos para melhor compreensão. JOÃO GOMES GRANGEIRO e ESPOSA tinham um terreno de 100m de frente por 100m de fundo, situado na Avenida D. Luís, no bairro de Aldeota, em Fortaleza. Os então proprietários deram em locação os 10.000 m2. Metade do terreno (5.000 m2) foi locado à AGROMAR - AGRICULTURA E PECUÁRIA LTDA. A outra metade (os 5.000 m2 restantes), foi dada em locação a “CASAS GOMES DE FREITAS LTDA.” O terreno continuou juridicamente com um só registro imobiliário. A Prefeitura, todavia, deu números de rua diferentes para cada uma das partes locadas. AGROMAR, que construiu um restaurante, recebeu o número 1.219; CASAS GOMES DE FREITAS LTDA, que construiu um supermercado, teve o número 1.255. Pois bem, o casal proprietário resolveu vender todo o imóvel ainda na vigência do contrato. Notificou ambos os locatários para que eles exercessem, no prazo legal, suas preferências. Uma das locatárias, “Casas Gomes de Freitas Ltda”, comprou todo o imóvel, ou seja, os 10.000 m2 e, a seguir, o vendeu a CONSTRUTORA COLMÉIA LTDA, que, por seu turno, aforou uma ação de despejo contra a outra locatária. AGROMAR, a locatária despejanda, sentindo-se lesada na venda do terreno por ela locado, ajuizou uma ação de nulidade de escritura de parte de venda do imóvel, cumulada com depósito pecuniário em desfavor do antigo casal proprietário/locador. O juiz monocrático (Dr. Edmo Magalhães Carneiro, da 13ª Vara Cível de Fortaleza) julgou una sententia ambas as ações. Teve por improcedente a ação de nulidade de escritura cumulada com depósito e por procedente o pedido de despejo. Não se dando por vencida, AGROMAR apelou. O egrégio TJCE, tendo como relator o eminente Desembargador JOSÉ MARIA DE MELO, conheceu da apelação e lhe deu provimento: “Locação. Alienação de imóvel. Em se tratando de terreno, e não de unidades habitacionais, o direito de aquisição do ocupante-locatário não se estende à outra porção do mesmo terreno de que não é locatário. A alienação a cada locatário, da parte que ocupa, não prejudica o direito do outro, como acontece se a alienação é feita a um só, incluída a parte da qual o adquirente não era locatário, máxime se a aquisição é feita pelo mesmo preço por quanto foi ofertada ao inquilino excluído. Isso tendo ocorrido, procedente é a ação de anulação da transação, intentada pelo inquilino preterido, por lhe assistir direito à adjudicação postulada. Apelação conhecida e provida. Decisão unânime”. 2. Insatisfeitos com a decisão do Tribunal a quo, CONSTRUTORA COLMÉIA LTDA, a compradora de todo o terreno, e o casal JOÃO GOMES GRANGEIRO, os vendedores e antigos proprietários/locadores, interpuseram, como já se falou, os presentes RECURSOS ESPECIAIS. 3. A primeira recorrente (a CONSTRUTORA) alega que o acórdão contrariou o disposto no art. 524 do CC, o art. 219 do CPC, bem como o art. 24, caput e § 6º, e art. 25 da Lei nº 6.649/79. Também contrariado restou o inciso XXII do art. 5º da CF. O ponto axial do inconformismo repousa no exercício do direito de preempção sobre imóvel locado, alusivo à totalidade ou apenas à parte dele, e, principalmente, o decurso do lapso temporal decadencial e seu modo de cômputo. Alega a recorrente que é impossível se considerar que o direito de propriedade de um terreno possa ser diferente •••
(STJ)