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BDI Nº.36 / 2009 - Jurisprudência Voltar

INCORPORAÇÃO EM REGIME DE PREÇO DE CUSTO – DEVER DO CONSTRUTOR E INCORPORADOR DE PRESTAR CONTAS, MESMO ENQUANTO NÃO HÁ PROPRIEDADE COMUM

Recurso Especial nº 782.631 - MG (2005⁄0154891-2) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: AGS Construtora e Incorporadora Ltda. Recorrente: Elo Engenharia e Empreendimentos Ltda. Recorrido: L\'Acqua Di Fiori Produtos Aromáticos Ltda. EMENTA Direito Civil e Processual Civil. Construção de edifício em regime de administração ou preço de custo. Prestação de contas. Legitimidade do adquirente. O dever do construtor e incorporador não se esgota com a apresentação das contas à comissão de representantes do condomínio. Honorários advocatícios devidos na primeira fase da ação de prestação de contas. - A Lei 4.591⁄64 trata os adquirentes de unidades autônomas construídas sob o regime de administração, ou preço de custo, como condôminos, mesmo enquanto não há propriedade comum, instituindo uma Assembléia Geral e uma Comissão de Representante como órgãos aptos a manifestar a vontade deste condomínio, tudo no intuito de prestigiar o associativismo e facilitar a proteção dos interesses de um grupo disperso de contratantes. Assim, em atenção a seus fins, essa formulação legal não deve ser tomada como excludente de outras garantias, mas apenas como um reforço a elas. - Na construção a preço de custo, o incorporador e⁄ou construtor se comprometem a administrar interesse alheio, para a construção de uma unidade individual e exclusiva, que, quando pronta, não comporá a parte comum do condomínio edilício. Por isso, não é razoável que a Comissão, representando o condomínio de adquirentes, ente estranho ao compromisso de compra-e-venda, possa dar a última palavra sobre o direito individual à propriedade exclusiva que foi objeto da promessa. - Os adquirentes das unidades habitacionais detêm legitimidade para a propositura de ação de prestação de contas em face do construtor e⁄ou incorporador, a despeito das atribuições legalmente acometidas à Comissão de Representantes. Precedentes. - Vencida a parte ré, que apresentou vigorosa resistência, cabível a fixação de honorários de advogado na primeira fase da ação de prestação de contas. Precedentes. Recursos Especiais não conhecidos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer de ambos recursos especiais, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 07 de outubro de 2008. Ministra Nancy Andrighi, Relatora RELATÓRIO Recursos especiais interpostos por AGS Construtora e Incorporadora Ltda., com fundamento na alínea “a” e “c” do permissivo constitucional, e por Elo Engenharia e Empreendimentos Ltda., com fundamento nas alíneas “a”, contra acórdão proferido pelo extinto Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. Ação: L\'Acqua di Fiori Produtos Aromáticos Ltda. ajuizou ação de prestação de contas em face de AGS Construtora e Incorporadora Ltda. (“AGS”) e Elo Engenharia e Empreendimentos Ltda. (“Elo”), alegando, em síntese, que celebrou com AGS promessa de compra de 2 unidades autônomas em edifício residencial. AGS, por sua vez, celebrou com Elo contrato para a efetiva construção do edifício, valendo-se do regime de administração a preço de custo. Formou-se, assim, um condomínio entre os adquirentes que suportaram os custos da obra e que remuneraram as requeridas através de uma taxa de administração. Embora já houvesse pago valores mais que suficientes à construção da obra, as rés ainda lhe cobravam valores para a construção. Por isso, pleiteou a prestação de contas. Sentença: Os pedidos foram julgados improcedentes, sob o argumento de que as rés já teriam prestado contas a quem de direito, ou seja, à comissão de representantes dos condôminos (fls. 176⁄179). Acórdão: Interposta apelação por L\'Acqua di Fiori Produtos Aromáticos Ltda. (fls. 190⁄194), o Tribunal de origem houve por bem dar provimento ao recurso, para reformar a sentença e condenar as requeridas a prestar contas no prazo de 48 horas. O acórdão trouxe a seguinte ementa: “PRESTAÇÃO DE CONTAS. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. AÇÃO INDIVIDUAL. INTERESSE E LEGITIMIDADE PRESENTES. NATUREZA DA INTERVENÇÃO DA COMISSÃO DE REPRESENTANTES. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A prestação de contas extrajudicial das incorporadoras à Comissão de Representantes, na forma do art. 61, alínea \'a\', da Lei 4.591⁄64, não impede a propositura da ação de prestação de contas individualmente pelos compradores das unidades, conforme precedente do colendo Superior Tribunal de Justiça (Resp. nº 233.001, Rel. Min. Nancy Andrighi)”. Embargos de Declaração: L\'Acqua di Fiori Produtos Aromáticos Ltda., AGS e Elo opuseram embargos de declaração (fls. 263, 264⁄270 e 271⁄274, respectivamente) e estes foram julgados pelo Tribunal de origem nos termos da seguinte ementa: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO EXISTENTE. HIPÓTESES DO ARTIGO 535 DO CPC. REEXAME DA MATÉRIA ANALISADA NO ARESTO COMBATIDO. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO PARA EFEITO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL OU EXTRAORDINÁRIO. VEDAÇÃO. Constatando-se a existência da omissão apontada nos embargos declaratórios, impõe-se seja complementando o acórdão sufragado no ponto em que se verifique a hipótese estabelecida pelo artigo 535 do Código de Processo Civil. A atribuição dos efeitos modificativos pretendidos pelas partes depende da verificação da existência das hipóteses estabelecidas no artigo 535 do Código de Processo Civil, reformando-se ou não o acórdão no ponto em que se verifique a omissão, contradição ou obscuridade alegadas. Os embargos de declaração não se configuram como via idônea para a obtenção do reexame das questões analisadas nos autos, mormente com o objetivo de prequestionar matéria como pressuposto para interpor Recurso Especial ou Extraordinário” (fls. 284⁄293). Primeiro Recurso Especial: AGS interpôs, então Recurso Especial (fls. 299⁄334), alegando violação aos seguintes dispositivos da lei federal: (i) 535 e 915, CPC, porque o Tribunal de origem, por um lado, conferiu efeitos infringentes aos embargos de declaração opostos pela recorrida, extravasando o âmbito de sua incidência, e, por outro lado, não sanou a omissão apontada nos embargos da recorrente, deixando de se pronunciar sobre a não incidência do CDC; (ii) art. 6o, I, LICC, por serem inaplicáveis as disposições do CDC à espécie, sobretudo porque o contrato entabulado entre as partes foi celebrado antes da entrada em vigor do referido diploma legal; (iii) arts. 914, CPC, 50 e 60 da Lei 4.591⁄64, porque a recorrida não teria legitimidade para, individualmente, requerer a prestação de contas; (iv) arts. 267, VI, CPC, e 29, Lei 4.591⁄64, uma vez que não administrou o patrimônio da recorrida, não se obrigou a prestar contas e, nesse sentido, não tem legitimidade passiva para prestá-las; (v) art. 20, CPC, pois não cabe condenação em honorários na primeira fase da ação de prestação de contas. Apontou a existência de dissídio pretoriano. Segundo Recurso Especial: Elo, por sua vez, interpôs Recurso Especial (fls. 353⁄362), alegando haver violação aos seguintes dispositivos da lei federal: (i) art. 6o, LICC, porque, ao determinar a aplicação do CDC à espécie, o acórdão recorrido violou a garantia da irretroatividade da lei e porque ordenar a prestação de contas já prestadas é fato que viola o ato jurídico perfeito; e (ii) art. 61, Lei 4.591⁄64, porque há ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir, tendo as contas sido regularmente apresentadas à comissão de representantes. Recurso Extraordinário: AGS interpôs Recurso Extraordinário a fls. 366⁄380, sob o argumento de que, ao admitir a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à hipótese, teria havido violação ao art. 5o, XXXV, CF. Juízo de Admissibilidade: Apresentadas contra-razões (fls. 383⁄394, 395⁄401, 402⁄407), o Tribunal de origem houve por bem não admitir ambos os recursos especiais interpostos. Negou seguimento, ademais, ao recurso extraordinário. Dei, no entanto, provimento aos Agravos de Instrumento interpostos por AGS (AG 656.822⁄PR) e por Elo (AG 656.817⁄MG) para melhor análise da questão e determinei a subida dos autos ao STJ. É o relatório. VOTO A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): Cinge-se a controvérsia a analisar a extensão do dever imposto às requeridas de prestar contas da obra que construíram sob o regime de administração por preço de custo. I. Violação ao art. 535, CPC. A Recorrente AGS sustentou que houve violação ao art. 535, CPC, pois o Tribunal de origem não sanou a omissão apontada nos embargos de declaração opostos. Ocorre que o acórdão hostilizado se manifestou sobre todos os pontos suscitados na apelação e respectivas contra-razões, alcançando solução que, de acordo com a unanimidade dos votantes, foi tida como a mais justa e apropriada para a hipótese vertente. A prestação jurisdicional dada, portanto, corresponde àquela efetivamente objetivada •••

(STJ)