A DÚVIDA NO REGISTRO DE IMÓVEIS. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO PERANTE O REGISTRO DE IMÓVEIS
1 - A dúvida caracteriza-se por ser procedimento jurídico-administrativo Apresentado um título para registro, e havendo exigência a ser satisfeita, o Oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do Oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimí-la. Dispõe a lei 6.015/73, em seu artigo 204 que “a decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente”. De acordo com a Lei 8.935/94, artigo 30, é dever dos Notários e dos Oficiais de registro, encaminhar ao juízo competente as dúvidas levantadas pelos interessados, obedecida a sistemática processual fixada pela legislação respectiva. No procedimento de dúvida não há litígio, pelo que a função do juiz é meramente administrativa, e não judiciária. A decisão administrativa quanto à dúvida suscitada poderá vir a ferir direitos, situação em que a parte interessada poderá fazer uso do processo contencioso, e somente a partir da instauração do processo contencioso é que pode falar propriamente em “processo”, pois na esfera administrativa não existe litígio. Alguns negam a natureza administrativa do procedimento de dúvida, e o assemelham ao de jurisdição voluntária, com o que não concordamos, pois a jurisdição voluntária tem previsão expressa no Código Civil e no Código de Processo Civil, enquanto que a dúvida tem previsão apenas administrativa. A lei 8.935/94 menciona expressamente a expressão “levantamento de dúvida”, enquanto a Lei de Registros Públicos – LRP menciona a expressão “declaração de dúvida”. Cotidianamente, a expressão mais utilizada é “processo de dúvida”, com a qual não concordamos, eis que a expressão mais adequada é “procedimento de dúvida”, posto que não existe litígio, e sim uma simples decisão administrativa. 2 - No procedimento da dúvida, as partes não estão sujeitas aos efeitos da revelia A lei 6.015/73 dispõe em seu artigo 198, que “havendo exigência a ser satisfeita, o Oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do Oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimí-la”. Por sua vez, dispõe o inciso III do mencionado artigo que “em seguida, o Oficial dará ciência dos termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para impugná-la, perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias”. Dispõe ainda o artigo 199 que “se o interessado não impugnar a dúvida no prazo referido no item III do artigo anterior, será ela, ainda assim, julgada por sentença”. No processo comum o réu é citado para todos os termos da ação proposta pelo autor, enquanto que no procedimento de dúvida o interessado será notificado pelo Oficial do Registro de Imóveis para impugnar a dúvida perante o juízo. No processo comum forma-se a relação processual somente após a citação do réu, devendo o mesmo contestar a ação sob pena de revelia, presumindo-se verdadeiros os fatos não impugnados, de acordo com a regra do artigo 302 do Código de Processo Civil - CPC. De acordo com o artigo 263 do CPC, “considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara. A propositura da ação, todavia, só produz, quanto ao réu, os efeitos mencionados no artigo 219 depois que for validamente citado”. Por sua vez, o artigo 219 do CPC dispõe que “a citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição”. Da interpretação dos mencionados textos legais, principalmente o artigo 199 da lei 6.015/73, é possível afirmar que não existe revelia no procedimento de dúvida, mesmo porque não há litígio, tratando-se de mera decisão administrativa do juízo. Embora decidida por juiz togado, tal decisão não se assemelha à sentença propriamente dita, pois, repita-se, não há partes nem litígio. 3 - O interessado não precisa, necessariamente, apresentar sua impugnação Não é obrigatória a apresentação de impugnação pelo interessado aos termos da dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, de acordo com o que dispõe o artigo 199 da lei 6.015/73, situação em que mesmo assim será ela julgada por sentença. Notificado pelo Oficial do Registro de Imóveis quanto aos termos da dúvida suscitada, é facultado ao interessado impugná-la perante o juízo no prazo de quinze dias, conforme inteligência do artigo 199, inciso III, da lei 6.015/73. 4 - A não apresentação, pelo interessado, da sua impugnação, NÃO ocasiona a perda da pretensão Conforme já narrado, o procedimento de dúvida tem natureza administrativa, não existindo litígio ou partes propriamente dito, assemelhando-se a processo de jurisdição voluntária, sendo uma faculdade do interessado impugnar a dúvida suscitada, e em não a impugnando mesmo assim será ela julgada por sentença, sendo certo que a não apresentação de impugnação em nada altera as pretensões do interessado. 5 - Mesmo não apresentando impugnação o Juiz julga a dúvida, por sentença Dispõe o artigo 199 da LRP que “se o interessado não impugnar a dúvida no prazo referido no item III do artigo anterior (quinze dias), será ela, ainda assim, julgada por sentença”. Tal artigo reforça mais uma vez a natureza administrativa do procedimento de dúvida, pois se no processo comum a não contestação da lide implica na aplicação da pena de confissão, no procedimento de dúvida tal preceito não é aplicado por imposição da lei de registros públicos, a qual empresta ao procedimento de dúvida a natureza jurídico-administrativa. Sobre o tema, vale lembrar as palavras do Doutor Ricardo Henry Marques Dip¹. [...] O doutor Vicente de Abreu Amadei terminou sua brilhante exposição indagando se a dúvida é um processo ou um procedimento. Inúmeras vezes tenho insistido nessa caracterização da dúvida como efetivamente um procedimento de caráter administrativo que tem por objeto material a recusa do registro lato sensu de um título no registro de imóveis e nos demais cartórios de registro. [...] O procedimento de natureza administrativa implica dizer, de saída, e isto é relevante, ausência de lide e ausência de coisa julgada material. Mas não se trata apenas de opor a idéia de jurisdição contenciosa a uma visão mais ou menos ampla do que também chamamos de jurisdição voluntária pelo bom motivo de que nenhuma decisão de jurisdição voluntária pode ser controlada por decisão em processo contencioso, diversamente do que ocorre naquilo que chamamos impropriamente de •••
Carlos Antonio Araújo (*)